O histórico de adaptações cinematográficas
baseadas em super-heroínas dos quadrinhos é deprimente. Além de elas terem recebido
poucas chances como protagonistas ao longo dos anos, principalmente se compararmos
com o número de filmes focados nas contrapartes masculinas, tais chances ainda resultaram
em verdadeiros desastres, resumindo-se a trinca Supergirl (aquele lançado em 1984), Mulher-Gato e Elektra. Levando
isso em consideração, chega a ser um alívio ver esse primeiro filme da Mulher-Maravilha, uma das principais heroínas
da DC Comics e que aqui ganha uma bela aventura pelas mãos da talentosa diretora
Patty Jenkins, que finalmente faz seu segundo longa-metragem, quatorze anos
após sua estreia no ótimo Monster:
Desejo Assassino.
Situado praticamente um século
antes da breve aparição da protagonista, Diana (Gal Gadot), em Batman vs. Superman, o filme mostra as
origens dela como guerreira amazona na ilha de Temiscira e o auxílio que ela
decide dar ao espião americano Steve Trevor (Chris Pine) na Primeira Guerra Mundial,
depois que o avião do sujeito cai acidentalmente em seu lar. No conflito, Diana
pretende destruir Ares, Deus da Guerra e figura que ela acredita estar por trás
de toda a destruição que está acontecendo entre os humanos.
Assim como O Homem de Aço, Mulher-Maravilha
não tem como um de seus principais focos construir um universo cinematográfico
dos heróis da DC Comics, como ocorreu às pressas em meio a bagunça de Batman vs. Superman e teve continuidade
ainda pior em Esquadrão Suicida. Sim,
há pequenas referências que ligam o filme aos seus antecessores (a principal
delas inclusive aparece logo de cara), mas o roteiro escrito por Alan Heinberg,
a partir do argumento concebido por ele, Jason Fuchs e Zack Snyder, prefere seguir
um caminho mais simples e objetivo, contando a história que tem em mãos e
explorando no processo as possibilidades que esta abre. Afinal, além de ter uma
super-heroína no centro da narrativa, o filme ainda a situa em um contexto histórico
obviamente conservador em 1918, com lugares unanimemente sendo preenchidos por
homens enquanto as mulheres ficam submissas a eles, não assumindo posições de
destaque (o que lamentavelmente ainda ocorre bastante em pleno 2017). Nisso, o
fato de Diana vir de um mundo completamente diferente, habitado e regido por
mulheres, e ser uma espécie de peixe fora d’água no mundo dos humanos possibilita
que o filme toque com naturalidade nessa desigualdade, seja em um pequeno
comentário que a personagem faz sobre o trabalho de secretária ou no silêncio
que ela causa com sua mera presença em uma sala cheia de militares.
Aliás, ver Diana se impor diante
dos homens ao seu redor é uma das melhores coisas do filme, de forma que ela
constantemente puxa para si a responsabilidade que outros não querem ou preferem
não assumir em determinadas situações. Nesse sentido, uma das melhores
sequências do filme é exatamente o confronto em um vilarejo no qual ela surge
no front de batalha como uma líder nata, sendo seguida por Steve Trevor e sua
equipe formada por Sameer (Saïd Taghmaoui), Charlie (Ewen Bremmer) e o Chefe
(Eugene Brave Rock). E já que falei em confronto, vale ressaltar que as cenas
de ação são conduzidas com uma segurança admirável por Patty Jenkins, que
mantém a geografia delas sempre clara para o espectador ao mesmo tempo em que
impõe um ritmo ágil e envolvente, algo que não se perde nem diante do uso
excessivo do slow motion, que aqui até
funciona para ressaltar as habilidades da protagonista e outros detalhes das
batalhas. Além disso, com o auxilio do excelente design de produção de Aline
Bonetto, a diretora concebe maravilhosamente a grandiosidade da ilha de
Temiscira e a recriação de época do nosso mundo em 1918, também sendo notável em
meio a isso a ótima fotografia de Matthew Jensen, que cria um contraste
apropriado entre os dois ambientes, com o primeiro surgindo em cena de maneira calorosa,
ressaltando a natureza cheia de humanidade das amazonas, enquanto que o segundo
é coberto de tons sombrios condizentes com a guerra.
Depois de ter uma participação
pequena demais para dizer a que veio em Batman
vs. Superman, Gal Gadot obviamente tem aqui a chance de realmente se destacar,
exibindo grande carisma no papel de Diana e encarnando com personalidade a
força da personagem e a indignação dela diante da natureza autodestrutiva dos
humanos, tornando-a uma super-heroína que rapidamente conquista a simpatia do
espectador. A atriz ainda tem uma bela dinâmica com o igualmente carismático Chris
Pine, cujo Steve Trevor se estabelece como o óbvio interesse amoroso da
protagonista, mas sendo também um elo emocional importante para fortalecer a
visão otimista que ela tem da humanidade. E se Robin Wright e Connie Nielsen se
destacam mesmo com pouco tempo de tela, fazendo de Antíope e Hipólita (tia e
mãe de Diana, respectivamente) personagens fortes e de autoridade
inquestionável em Temiscira, o mesmo não se aplica a David Thewlis e Danny
Huston, que têm papeis meio subdesenvolvidos como Sir Patrick Morgan e o vilão Erich
Ludendorff.
Apesar de decepcionar um pouco em sua batalha
final, que tenta se sustentar mais na grande escala dos efeitos visuais do que
em qualquer outra coisa, Mulher-Maravilha
consegue se estabelecer como um exemplar bastante consistente entre os filmes
de super-heróis, o que é importante especialmente em tempos em que a falta de representatividade
vem sendo cada vez mais questionada. Assim, o filme é um sopro de ar fresco
para os projetos focados em super-heroínas dos quadrinhos e uma boa companhia a
outras superproduções protagonizadas por mulheres (como O Despertar da Força, Caça-Fantasmas
e Rogue One). Perto disso, ser o acerto
que o universo cinematográfico da DC Comics estava precisando é um bônus.
Nota:
2 comentários:
Belo texto, Thomas! Outro filme importante com protagonista feminina é Mad Max - A Estrada da Fúria. Abraços!
Completamente diferente do que estamos acostumados a ver na DC Comics. A coloração do filme foi excelente, e a história não é tão confusa. Gal Gadot esta impecável. Adoro porque sua atuação não é forçada em absoluto. Na minha opinião, este foi um dos mehores mulher maravilha movie que foi lançado. O ritmo é bom e consegue nos prender desde o princípio O filme superou as minhas expectativas, o ritmo da historia nos captura a todo o momento. Além, acho que a sua participação neste filme da DC Comics realmente ajudou ao desenvolvimento da história. Eu sem dúvida verei novamente.
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