quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Breve Comentário - Dossiê Jango

A morte do ex-presidente brasileiro João Goulart, em dezembro de 1976, sempre foi cercada de muito mistério. Mesmo com a afirmação de ele teria morrido em decorrência de um ataque cardíaco, muitas pessoas próximas a ele ainda têm suspeitas de que seu falecimento decorrera por outros meios. Isso rende um material interessantíssimo nas mãos do diretor Paulo Henrique Fontenelle (o mesmo de Loki - Arnaldo Batista) neste excelente documentário Dossiê Jango.
Trazendo entrevistas com familiares de Jango, historiadores, jornalistas, políticos e outras figuras que conhecem o caso e viveram naquela época, Dossiê Jango disseca um período em que o Brasil vivia em meio a grandes segredos. Fontenelle intercala as entrevistas com imagens de arquivo e recortes de jornais de maneira muito natural, em uma montagem ágil e que compõe uma narrativa incrivelmente envolvente, que retrata com eficiência os anos da Ditadura Militar ao mesmo tempo em que faz uma investigação instigante sobre o que poderia ter realmente acontecido com João Goulart.
Nesse último quesito, aliás, Dossiê Jango traz questões relevantes e que merecem ser abordadas, como por exemplo, o detalhe de que vários outros líderes importantes da política sul-americana terem morrido mais ou menos na mesma época e em circunstâncias no mínimo curiosas (entre eles, Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda), além do fato de não ter sido feita uma autópsia do corpo de João Goulart. Chega a ser realmente uma surpresa que ninguém tenha investigado mais a fundo a morte do ex-presidente. E o tom conspiratório que percorre toda a narrativa torna tudo ainda mais interessante.
Se ao longo de Dossiê Jango, Paulo Henrique Fontenelle não convence o espectador de que a morte de João Goulart pode não ter sido tão simples quanto parece, ao menos ele deve deixá-lo com uma bela pulga atrás da orelha, mostrando que este caso merecia uma apuração um pouco maior.

sábado, 24 de agosto de 2013

Sem Dor, Sem Ganho

Baseando praticamente toda sua carreira em superproduções, Michael Bay trouxe mais porcarias do que filmes bons para o público (A Rocha e Armageddon são seus melhores trabalhos até hoje). No entanto, depois do sucesso que alcançou com a fraca franquia Transformers, não deixa de ser curioso vê-lo comandar um projeto com um orçamento bem mais baixo do que aquele com o qual ele está acostumado. Mais curioso ainda é que tal projeto seja baseado em uma história real. Mas mesmo que este Sem Dor, Sem Ganho possa ser uma espécie de novos ares para o diretor, a produção acaba sendo outro ponto baixo em sua carreira.
Escrito por Christopher Markus e Stephen McFeely, Sem Dor, Sem Ganho se passa entre 1994 e 1995 e conta a história de Daniel Lugo (Mark Wahlberg), fisiculturista que trabalha em uma academia e que deseja viver o chamado “Sonho Americano”. Depois de frequentar as palestras de Johnny Wu (Ken Jeong), Daniel decide ser um “realizador” e não um “acomodado”, bolando um plano para se dar bem. O plano: sequestrar um de seus clientes mais ricos, Victor Kershaw (Tony Shalhoub), e fazê-lo entregar tudo o que possui de valor. Para isso, Daniel pede ajuda a seus colegas Paul Doyle (Dwayne Johnson) e Adrian Doorbal (Anthony Mackie).
Quando Sem Dor, Sem Ganho começa, somos jogados quase que imediatamente em um típico universo de Michael Bay, onde o uso de ângulos baixos e travellings circulares não tem muita lógica, o slow motion é usado aborrecidamente e as mulheres surgem apenas como meros objetos sexuais. Mas admito que é um alívio ver que, ao longo de suas duas horas de duração, Sem Dor, Sem Ganho conte com apenas uma cena de explosão e poucos momentos epiléticos, uma evolução considerável do diretor (mas arrisco dizer que isso seja temporário, considerando que Transformers 4 vem aí no ano que vem).
Já a trama começa aparentemente simples, mas vai ficando gradativamente absurda. Boa parte disso se deve ao fato de Daniel, Paul e Adrian não serem criminosos dos mais eficientes, e isso é algo que poderia fazer de Sem Dor, Sem Ganho uma obra divertidíssima. No entanto, Michael Bay mostra ter uma mão pesada demais para conduzir os momentos cômicos do filme, e boa parte deles acabam não conseguindo causar risos da forma que pretendem, como na primeira tentativa do trio principal de sequestrar Victor (uma cena em que a trapalhada dos personagens irrita mais do que diverte) ou quando eles tentam matar alguém e não conseguem de jeito nenhum. É claro que aqui e ali o filme faz graça (difícil não rir no momento em que a trama se torna tão absurda a ponto de o diretor precisar lembrar o público de que este está vendo uma história real), mas isso ainda é pouco perto do que ele tenta alcançar.
Além disso, o roteiro se mostra muito preguiçoso na hora de desenvolver seus personagens, apelando para narrações em off que apresentam cada um deles, explicam como eles pensam e como chegaram naquele ponto. Aliás, um problema grave nisso é exatamente o detalhe de o filme trocar de narrador constante e bruscamente. Uma hora este papel fica a cargo de Daniel, em outra fica desnecessariamente com Victor e até mesmo com Sorina (Bar Paly), personagem secundária cuja visão com relação ao que acontece ao seu redor não tem importância.
Mas o que surpreende em Sem Dor, Sem Ganho é o fato de ele ter nomes talentosos em seu elenco e ainda assim não conseguir criar um maior envolvimento com a história e seus personagens. Mark Wahlberg, Dwayne Johnson e Anthony Mackie até trazem certa credibilidade para Daniel, Paul e Adrian, mas estes se revelam personagens brutos e estúpidos demais, não sendo figuras muito carismáticas, mesmo que em alguns momentos consigam divertir (como quando Paul revela um dos dons que Deus lhe deu ou quando Daniel fala extremamente rápido em uma cena específica no terceiro ato). Enquanto isso, Ken Jeong entra e sai do filme sem deixar muitas marcas, ao passo que Tony Shalhoub e Ed Harris fazem o que podem com Victor Kershaw e o detetive Ed DuBois, mas os personagens não chegam a ser realmente interessantes.
Sem Dor, Sem Ganho certamente poderia ter sido uma bela comédia de humor negro, mas infelizmente não é o que acontece aqui. E é por ver uma história com grande potencial sendo desperdiçada que o filme pode ser considerado uma lamentável decepção.
Cotação:

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Percy Jackson e o Mar de Monstros

Em uma época em que a saga de Harry Potter estava quase chegando ao fim, Percy Jackson e o Ladrão de Raios foi lançado com o intuito de tentar estabelecer uma nova franquia infanto-juvenil. Mesmo com a produção em grande escala e o elenco cheio de nomes conhecidos (como Sean Bean, Pierce Brosnan, Uma Thurman, entre outros), o resultado do filme não foi dos melhores, decepcionando boa parte das pessoas. Mas os livros de Rick Riordan (que não li) ganham mais uma chance nesta continuação, Percy Jackson e o Mar de Monstros, que apesar de não ser um grande filme, ainda consegue ser um passatempo divertido.
Escrito por Marc Guggenheim, Percy Jackson e o Mar de Monstros começa com um pequeno flashback que mostra que a grande proteção do Acampamento Meio-Sangue deve-se a uma árvore concebida por Zeus a partir do sacrifício de sua filha, Thalia. Voltando aos tempos atuais, Percy (Logan Lerman) e os outros residentes do acampamento são atacados depois que Luke (Jake Abel) envenena a árvore, deixando o lugar em risco. Ao lado de seus amigos Annabeth (Alexandra Daddario) e Grover (Brandon T. Jackson), Percy decide ir em busca do Velocino de Ouro, que representa a única chance de salvar a árvore e o acampamento. O problema é que Luke também quer o Velocino, mas para um propósito diferente: ressuscitar o titã Cronos, que foi destruído pelos deuses do Olimpo e agora planeja sua vingança. Em meio a isso, Percy ainda precisa lidar com a chegada de seu meio-irmão, o atrapalhado ciclope Tyson (Douglas Smith).
Percy Jackson e o Mar de Monstros comete alguns dos mesmos pecadilhos do filme anterior. Sempre que aparecem criaturas novas naquele universo, por exemplo, o roteiro inclui falas que dizem superficialmente o que elas são, seja um Touro de Colchis ou um Hipocampo (que, por sinal, são bem realizados pela equipe de efeitos visuais), além de outras desnecessariamente expositivas (“Ciclopes são à prova de fogo”, diz Tyson depois que uma baforada de fogo não lhe causa nenhum arranhão). Além disso, o roteiro segue a mesma estrutura usada anteriormente, com Percy ganhando certos acessórios que acabam sendo necessários nas situações em que ele e seus amigos se metem ao longo da missão, o que rende momentos que transformam o filme em um jogo de videogame muito óbvio.
No entanto, vale dizer que o diretor Thor Freudenthal (o mesmo por trás dos filmes bobinhos da série Diário de Um Banana) surpreende na condução das cenas de ação. Comandando-as com energia, Freudenthal é bem sucedido ao fazer com que essas sequências não se tornem um tanto aborrecidas ou burocráticas, algo que Chris Columbus não conseguiu impedir no primeiro filme. Cenas como o treinamento que aparece logo no início da história, o ataque do Touro de Colchis no acampamento e uma fuga em um iate cumprem a tarefa de prender a atenção.
Enquanto isso, o talentoso Logan Lerman volta a encarnar Percy Jackson com carisma, tendo ainda uma boa dinâmica com os também carismáticos Alexandra Daddario e Brandon T. Jackson. Já Jake Abel retorna ao papel de Luke da mesma maneira aborrecida do primeiro filme, ao passo que Douglas Smith aparece simpático como Tyson, impedindo que o personagem se torne irritante com suas trapalhadas. E se Stanley Tucci arranca alguns risos em suas poucas cenas como Dionísio (a piada que ele faz envolvendo água e vinho é um dos momentos mais inspirados do filme), o ótimo Nathan Fillion aproveita seu pouquíssimo tempo de tela para fazer do deus Hermes uma figura divertida e interessante (chega a ser uma pena que ele apareça tão pouco).
Mas por mais que Percy Jackson e o Mar de Monstros consiga divertir, há de se ressaltar que seu terceiro ato é particularmente irregular. Nessa parte, o filme não só perde um pouco de seu ritmo como também traz momentos que não causam impacto algum na história, como alguns acontecimentos trágicos envolvendo personagens importantes e que inclusive resultam em reviravoltas previsíveis. Uma cena específica envolvendo Annabeth, aliás, poderia ter sido cortada do filme sem maiores problemas, já que não acrescenta absolutamente nada à narrativa. E a batalha final não nos faz temer pelo destino dos personagens, sendo que ainda é resolvida muito facilmente, o que é decepcionante.
Mesmo com suas escorregadas, Percy Jackson e o Mar de Monstros resulta em um filme um pouco mais satisfatório do que seu antecessor. Mas a franquia ainda precisa comer muito feijão com arroz se quiser se estabelecer como algo realmente relevante.
Cotação:

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Círculo de Fogo

O Japão é uma grande fonte de séries de televisão que colocam robôs gigantes lutando contra monstros igualmente gigantes que causam grande destruição por onde passavam. Tais programas também fizeram sucesso no Brasil, principalmente entre as décadas de 1980 e 1990, e devo dizer que passei boa parte da minha infância assistindo a alguns deles, como Changeman, Ultraman e a versão americana dos Power Rangers. Dito isso, o diretor mexicano Guillermo del Toro deve gostar de produções desse tipo, considerando que este seu mais novo trabalho, Círculo de Fogo, é claramente influenciado por elas, sendo uma espécie de homenagem ao mesmo tempo em que busca ser algo original. E o filme alcança seus objetivos de maneira muito empolgante.
Escrito pelo próprio Guillermo del Toro em parceria com Travis Beacham a partir de um argumento escrito por este último, Círculo de Fogo mostra que uma fenda abriu no meio do Oceano Pacífico, servindo como portal para que grandes monstros, conhecidos como Kaijus, invadam cidades e destruam tudo o que veem pela frente. Para combatê-los, os humanos construíram robôs chamados de Jaegers, que devem ser controlados por dois pilotos cujas mentes ficam conectadas. Quando o programa de Jaegers fica ameaçado, já que os Kaijus parecem estar se fortalecendo com o passar do tempo, o comandante Stacker Pentecost (Idris Elba) resolve pôr em prática um último plano para destruir os monstros, e para isso ele pede ajuda a um velho conhecido, Raleigh Becket (Charlie Hunnam), piloto que se aposentou após uma tragédia envolvendo seu irmão.
Como é costumeiro em boa parte das produções comandadas por Guillermo del Toro, Círculo de Fogo conta com um universo muito interessante e que foi pensado nos mínimos detalhes pelo diretor. Nesse sentido o filme é tecnicamente impecável. A bela fotografia de Guillermo Navarro (parceiro habitual de del Toro) traz um belo tom fantasioso ao filme, enquanto que o excepcional design de produção compõe esse universo grandiosamente. Já os efeitos visuais concebem os Jeagers e os Kaijus brilhantemente, também fazendo com que eles interajam com os cenários vistos na tela sempre de maneira convincente, ao passo que os efeitos sonoros ajudam as criaturas e as máquinas a se tornarem ainda mais verossímeis, seja pelos rugidos dos monstros ou por toda mecânica envolvida na criação dos robôs. Se o filme não for indicado a alguns Oscars nas categorias técnicas será realmente decepcionante.
Enquanto isso, as cenas de batalha são brilhantemente orquestradas por del Toro, deixando o espectador sempre a par do que está acontecendo ao mesmo tempo em que muito bem as diversas habilidades dos Jeagers e dos Kaijus. Aliás, o diretor não capricha apenas nas sequências envolvendo esses gigantes, trazendo uma ótima cena de treinamento entre Raleigh e a iniciante Mako Mori (Rinko Kikuchi). E a belíssima trilha composta por Ramin Djawadi ajuda essas cenas e o filme em si a ficarem mais empolgantes. Além disso, diferente do que se vê, por exemplo, nos filmes de Transformers, Círculo de Fogo demonstra não estar preocupado apenas com explosões e coisas do tipo, desenvolvendo com eficiência sua história e os personagens, que são muito interessantes e em vários momentos se encontram em desvantagem nas lutas com os Kaijus, o que não só nos faz temer pelo seu destino como também torna o filme um tanto imprevisível.
Para completar, del Toro acerta na escalação de seu elenco. Charlie Hunnam surge carismático e determinado no papel de Raleigh, enquanto que o brilhante Idris Elba usa todo seu talento para fazer de Stacker Pentecost um personagem de autoridade absoluta (o momento em que ele pede para Raleigh repetir algo em seu ouvido é sensacional). Já Rinko Kikuchi merece aplausos por conseguir compor Mako como uma mulher tão forte e capaz quanto os homens que aparecem no centro de comando dos Jeagers, tendo ainda uma ótima química com Hunnam e Elba. E se Charlie Day e Burn Gorman fazem dos cientistas Newton Geiszler e Hermann Gottlieb alívios cômicos eficientes, Ron Perlman praticamente rouba o filme nas poucas cenas em que aparece, usando sua ótima presença e timing cômico para fazer de Hannibal Chau uma figura muito divertida.
Depois de cinco anos sem dirigir um filme (seu último trabalho havia sido Hellboy 2), é bom ver Guillermo del Toro voltar com uma produção como Círculo de Fogo, um blockbuster que não subestima a inteligência do público, entretendo-o do início ao fim com seu espetáculo. Só espero que o diretor não volte a ficar tanto tempo sem fazer um filme.
Obs.: Há uma cena divertida durante os créditos finais.
Cotação:

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Breve Comentário - Os Smurfs 2

Ultimamente, quando filmes infantis que misturam live action com CGI são realizados, quase sempre o resultado é insatisfatório, revelando certa displicência na hora do desenvolvimento dos projetos. Garfield, Alvin e os Esquilos e Os Smurfs são exemplos dessa onda. Mas produções assim ainda conseguem fazer algum sucesso financeiro, e não é à toa que os personagens criados pelo belga Peyo estão de volta neste Os Smurfs 2. No entanto, o filme mostra ser tão bobo e previsível quanto seu antecessor.
Escrito por J. David Stem e David Weiss em parceria com Jay Scherick, David Ronn e Karey Kirkpatrick, Os Smurfs 2 traz Papa Smurf (voz de Jonathan Winters), Desastrado (Anton Yelchin) e companhia tendo que ir a Paris para resgatar Smurfette (Katy Perry), que foi sequestrada por Gargamel (Hank Azaria) e os Smurfs que ele criou, Vexy (Christina Ricci) e Hackus (J.B. Smoove). Para ajudar na missão, os pequenos recorrem a seus velhos amigos Patrick (Neil Patrick Harris) e Grace (Jayma Mays), que desta vez ainda trazem Victor (Brendan Gleeson), o padrasto de Patrick.
Ao longo da projeção, vemos várias tentativas de se fazer humor, que vão desde as características dos Smurfs (as trapalhadas de Desastrado ou a admiração que Vaidoso tem por si mesmo) até referências a filmes famosos (a mais óbvia é aquela de Bonequinha de Luxo). Mas além de serem pouco inspiradas, tais gags ainda contam com a falta de timing cômico de seu diretor, Raja Gosnell, e consequentemente elas não causam muito o riso. E ainda que Hank Azaria, um dos pouquíssimos pontos positivos do primeiro filme, consiga divertir de vez em quando com sua interpretação como Gargamel, isso não chega a ser o suficiente para tornar o filme algo realmente engraçado.
Além disso, o roteiro desenvolve uma história óbvia desde o começo, algo que reflete até em suas subtramas, como o fato de Patrick não gostar de ter Victor como figura paterna, o que apenas leva a um conflito previsível e desnecessário. E por mais carismáticos que sejam o elenco e os personagens, isso não ajuda a história a ser algo mais agradável de se acompanhar.
No fim, Os Smurfs 2 parece servir apenas como desculpa para render diversos produtos derivados que devem ser comprados para as crianças, ficando longe do encantamento proporcionado por seu material original.
Cotação: