domingo, 28 de agosto de 2016

Café Society

Nos levando até a Hollywood da década de 1930, Café Society é um filme que não deixa de remeter a produções como Tiros na Broadway e Meia-Noite em Paris quando analisamos o que Woody Allen já fez ao longo de sua carreira. Ao situar suas histórias nesses tempos, o diretor tem a chance de aproveitar o conhecimento que tem sobre eles para conceber obras curiosas, nas quais ele mesmo (através de alter egos) pode interagir com os universos que relembra. Mas se aqueles dois filmes são trabalhos de destaque na filmografia do cineasta, aqui ele escorrega, não conseguindo desenvolver uma trama das mais cativantes, de forma que dessa vez o que ele traz de bom infelizmente precisa dividir espaço com uma série de elementos ora descartáveis, ora desinteressantes.

Café Society nos apresenta a Bobby Dorfman (Jesse Eisenberg), rapaz que sai da casa dos pais (Ken Stott e Jeannie Berlin) em Nova York e para ir à Hollywood trabalhar com seu tio, Phil (Steve Carrell), um agente bastante influente entre as grandes estrelas do cinema e os cabeças dos estúdios. É então que ele começa a passar boa parte de seu tempo com a assistente de Phil, Vonnie (Kristen Stewart), se apaixona inevitavelmente, ainda que a jovem já tenha namorado. O que se vê é o início de uma série de complicações na vida amorosa de ambos.

Em questões puramente estéticas, Café Society é um deleite para os olhos. O design de produção e os figurinos fazem um trabalho de recriação de época encantador, enquanto que a fotografia de Vittorio Storaro enche as imagens com uma energia calorosa e intensa. Mas tais elementos servem principalmente para que Woody Allen consiga estabelecer a elegância e o conforto vivenciados pelos personagens, com direito a festas glamorosas ocorrendo em grandes mansões, sendo notável a capacidade que essas luxuosidades têm de influenciar o jeito de pessoas mais humildes como Bobby e Vonnie.

Ambos os personagens, aliás, são vividos com carisma por Jesse Eisenberg e Kristen Stewart, sendo que o primeiro claramente emula a excêntrica insegurança que faz parte da persona de Woody Allen como ator, ao passo que a segunda (cada vez mais provando que a “saga” Crepúsculo foi um desperdício de seu talento) nos faz compreender facilmente o encantamento que Bobby sente por Vonnie, algo que vai além da beleza. Entre os coadjuvantes, Steve Carell se destaca no papel de Phil, retratando bem as dúvidas e o prestígio do personagem, enquanto que intérpretes como Blake Lively, Corey Stoll, Parker Posey, Ken Stott e Jeannie Berlin não têm a mesma sorte, não tendo muitas chances para brilhar.

Mas o mais lamentável é que, em meio a coisas interessantes, Café Society conte com um roteiro tão problemático, no qual Woody Allen às vezes parece não saber o que fazer com a história. Durante a projeção, ver sinais de inspiração por parte do realizador, como na cena em que os pais de Bobby discutem religião (“Uma pena que a religião judaica não tenha vida após a morte. Teria mais clientes”), prova ser algo raro, já que no geral o que vemos é um enredo que não foge do óbvio ao abordar a capacidade dos personagens de se apaixonarem por mais de uma pessoa, inserindo-os em conflitos aborrecidos e previsíveis.

Além disso, Woody Allen aposta em cenas e subtramas que pouco ou nada acrescentam à narrativa, como o encontro de Bobby com uma prostituta (interpretada por Anna Camp) ou os momentos pontuais em que acompanhamos a rotina de mafioso do irmão mais velho do rapaz, Ben (papel de Corey Stoll), cujas tentativas de humor se baseiam em uma única piada (o destino que ele dá para algumas pessoas), que fica rapidamente repetitiva. Considerando que o filme é relativamente curto (cerca de 90 minutos), a encheção de linguiça resultante desses elementos até indica que Allen não tinha muito material para desenvolver na história que queria contar. Para completar, a narração em off do próprio diretor se mostra bastante preguiçosa, servindo para sintetizar expositivamente uma série de coisas e, por vezes, ressaltar detalhes que já ficaram mais do que claros para o espectador.

Café Society acaba sendo um filme que tem muito do charme que se vê em praticamente todos os trabalhos de Woody Allen. Mas sem o conteúdo rico que o cineasta é capaz de proporcionar, o longa se revela uma experiência frustrante, passando uma sensação de incompletude tristemente parecida com a vida amorosa de seus personagens.

Nota:

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Águas Rasas

Estudante de medicina e surfista nas horas vagas, Nancy Adams (Blake Lively) vai a uma praia secreta no México, um lugar que era importante para sua falecida mãe. No entanto, o que deveria ser apenas um período de paz e tranquilidade aproveitando as ondas do mar logo se torna o mais puro terror, com Nancy ficando isolada sobre uma pedra em meio às águas enquanto é perseguida por um tubarão, sem conseguir ajuda e passando a fazer de tudo para sobreviver.

A história de Águas Rasas fica longe de ser original, de forma que ao longo da projeção é inevitável lembrar de longas como Mar Aberto (uma obra que deveria ser um pouco mais apreciada) ou até mesmo o recente Perdido em Marte, que também trazia um personagem tentando sobreviver contra todas as probabilidades. Mas isso acaba pouco importando, já que não impede o diretor Jaume Collet-Serra (que de uns tempos para cá ficou conhecido por thrillers de ação protagonizados por Liam Neeson, como Sem Escalas e Noite Sem Fim) de conseguir fazer com que um lugar lindo, tratado como se fosse um paraíso na Terra, se torne um verdadeiro inferno, e aqui destaco a cena em que o realizador, com a ajuda do diretor de fotografia Flavio Labiano, pinta apropriadamente de vermelho as águas ao redor da protagonista, como se ligasse o sinal de alerta quanto a gravidade da situação enfrentada por ela.

A partir daí, Collet-Serra é hábil ao conceber uma narrativa ágil e envolvente e que traz uma atmosfera constantemente inquietante. Nisso, o cineasta ainda tem o auxílio da trilha de Marco Beltrami, que ressalta bem a tensão sem tentar roubar a cena com sustos baratos, e do roteiro de Anthony Jaswinski, que, assim como o que víamos em Mar Aberto, pontualmente insere momentos de falsa esperança que elevam a angústia proporcionada pela narrativa, nos deixando ainda mais curiosos para saber como Nancy escapará do tubarão. Tendo isso em vista, é até desnecessário que o filme abra a projeção com uma cena que, na verdade, só ocorre no terço final da narrativa, uma forma um tanto boba de criar um suspense quanto ao decorrer da trama e o destino da personagem.

Apesar disso, o roteiro de Anthony Jaswinski faz um bom trabalho ao desenvolver Nancy de maneira que ela não seja uma figura meramente unidimensional. Mas muito desse aspecto, claro, se deve também a ótima atuação de Blake Lively, que carrega a narrativa com uma segurança admirável, exibindo um carisma que facilita para que o público se aproxime de Nancy e torça por ela. Lively encarna com propriedade a força e a determinação da personagem, sem esquecer de mostrar o desgaste que ela vai sofrendo à medida que o tempo passa e as chances dela sair inteira dali vão diminuindo (se tivéssemos uma atriz menos interessante no papel, o filme correria o risco de desmoronar). Para completar, o roteiro não deixa de fazer com que Nancy convenientemente seja a figura perfeita para ficar em uma situação como a que acompanhamos aqui, já que ela tem conhecimentos e habilidades que acabam sendo úteis. Mas, por sorte, isso não diminui a dificuldade do embate entre Nancy e o tubarão, chegando a render uma das cenas mais aflitivas do filme quando ela improvisa o fechamento de um ferimento.

Fiel à simplicidade de sua trama, não tentando estica-la além do necessário e preenchendo muito bem seus pouco mais de 80 minutos de duração, Águas Rasas surpreende e consegue se estabelecer como um exercício de gênero eficiente, mostrando saber como construir uma narrativa que mantém o espectador na ponta da poltrona do cinema.

Nota:

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Olimpíadas no Cinema


Milhares de atletas do mundo todo reunidos para disputar as mais diversas modalidades e alcançar marcas que podem mudar suas vidas. As Olimpíadas estão rolando no Rio de Janeiro e empolgando com cada medalha, cada vibração de seus participantes. Quem me segue no Twitter sabe o quanto estou curtindo ver as disputas, sendo que até esportes que nunca acompanhei antes têm se provado interessantes.

Sendo assim, decidi fazer este pequeno post com alguns filmes que trazem as Olimpíadas em suas histórias. É o mínimo que eu poderia fazer aqui no blog para aproveitar um evento que ocorre apenas de quatro em quatro anos. Vale dizer que não considerei aqui filmes com as Olimpíadas de Inverno (afinal, eles podem ser pauta para outro post no futuro).

Olympia (1938), de Leni Riefenstahl

Adolf Hitler queria que as Olimpíadas de 1936, em Berlim, fossem um grande chamariz não só para seu regime nazista, mas também para a superioridade ariana que ele tanto presava. Nesse sentido, Leni Riefenstahl fez em Olympia um documentário que em alguns momentos pode ser visto como propagandista, assim como seu trabalho anterior, O Triunfo da Vontade. Mas na maior parte tempo das duas partes do filme (intituladas Ídolos do Estádio e Vencedores Olímpicos), Riefenstahl ignora o contexto político e quaisquer polêmicas nos bastidores dos jogos e se concentra nos esforços dos atletas em várias modalidades, merecendo óbvio destaque o feito do americano Jesse Owens, maratonista negro que conquistou quatro medalhas de ouro na terra do Führer, mandando para o espaço a tal superioridade ariana. Além disso, é impossível não notar o senso estético de Riefenstahl, sejam nas belas imagens da sequência de abertura ou nos movimentos e ângulos de câmera que ela conseguiu fazer para acompanhar as disputas.

Carruagens de Fogo (Chariots of Fire, 1981), de Hugh Hudson

Quando se fala em Olimpíadas no cinema, é bem provável que Carruagens de Fogo seja o primeiro filme a vir na mente das pessoas, ao passo que a icônica trilha de Vangelis é a música que acompanha qualquer corrida feita em câmera lenta. Mas ainda que o longa de Hugh Hudson seja mais lembrado pela trilha que o embala, seria injusto ignorar o quão interessante ele é ao acompanhar a história de Harold Abrahams (Ben Cross) e seu rival Eric Liddell (Ian Charleson), dois corredores que veem suas histórias chegarem às Olimpíadas de 1924. O primeiro é obcecado em vencer, até para driblar obstáculos que podem aparecer em seu caminho por conta de sua origem judia, enquanto o segundo é um devotado cristão que corre por sua honra e a de seu Deus. O interesse aqui não é criar um choque de ideais entre os dois protagonistas, mas sim mostrar a excelência deles em meio a suas diferenças, além da determinação de ambos para alcançarem seus objetivos. Admirável no retrato do espírito olímpico de seus personagens, a produção levou o Oscar de Melhor Filme em 1982.

Munique, 1972: Um Dia em Setembro (One Day in September, 1999), de Kevin Macdonald e Munique (Munich, 2005), de Steven Spielberg

Dois filmes colocados lado a lado. Isso porque tanto Munique, 1972: Um Dia em Setembro quanto Munique envolvem a mesma história e acabam se complementando. Nas Olimpíadas de 1972, quando a Alemanha voltou a receber os jogos, terroristas palestinos da Organização Setembro Negro invadiu a Vila Olímpica e atacou a delegação de atletas israelenses, culminando em uma grande tragédia. O documentário de Kevin Macdonald (que faturou o Oscar da categoria em 2000) mostra em detalhes cada passo do ataque, resgatando imagens de arquivo que, somadas aos depoimentos conseguidos pelo diretor, ajudam a tornar a narrativa impactante. Já o filme de Spielberg foca na operação feita posteriormente, na qual um esquadrão teve como objetivo matar palestinos supostamente envolvidos no ataque, uma história que aqui resulta em um dos trabalhos mais marcantes da carreira do diretor.

A Fúria da Liberdade (Freedom’s Fury, 2006), de Colin K. Gray e Megan Raney

Nas Olimpíadas de 1956, Hungria e União Soviética se encontraram nas semifinais do pólo aquático, algo que resultou em uma das partidas mais violentas da história do evento. Mas o que este documentário A Fúria da Liberdade mostra é que, para entender o que ocorreu no jogo, é preciso recapitular a relação entre os dois países na época, com a Hungria tendo sido ocupada pela União Soviética depois da Segunda Guerra Mundial, passando por uma série de opressões que impediam a liberdade de seus cidadãos, o que culminou em uma grande revolução. Com isso sendo muito bem estabelecido, o documentário deixa claro que os ânimos entre os jogadores não estavam particularmente bons, e a imagem do húngaro Ervin Zádor saindo da piscina com o rosto sangrando serviu para sintetizar a pequena guerra que a partida representou.

Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo (Foxcatcher, 2014), de Bennett Miller

Os irmãos Mark e Dave Schultz eram grandes campeões olímpicos de luta greco-romana no final da década de 1980. Foi quando aceitaram fazer parte da equipe Foxcatcher comandada por John du Pont, sem poder imaginar no quão trágico isso viria a ser para suas vidas. Bennett Miller levou a história para as telonas neste Foxcatcher, realizando um drama forte e melancólico sobre o amor entre dois irmãos, a determinação deles em vencer e o desejo de um homem psicologicamente frágil de provar seu valor. A história retratada aqui também é foco do documentário Team Foxcatcher, um filme eficiente mesmo que inferior a este de Miller, que ainda traz excelentes atuações do trio Steve Carrell, Mark Ruffalo e Channing Tatum. Crítica completa aqui.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Um Espião e Meio

Dwayne Johnson e Kevin Hart não poderiam ser atores mais diferentes. É algo que, obviamente, não se vê só no que diz respeito à estatura de cada um, mas também nas personas que eles têm criado nas telonas. Enquanto Johnson faz o tipo herói de ação durão, boa-praça e que parte para a porrada sempre que necessário, Hart na maioria das vezes surge com uma postura histérica para causar o riso, o que às vezes pode funcionar, mas também é capaz de irritar profundamente (como no fraco Policial em Apuros). Um Espião e Meio tenta se aproveitar exatamente do choque entre as características dos dois atores ao trazê-los no centro de sua cômica trama de ação. Mas, ainda que a dupla cause algumas risadas, o longa não consegue se sustentar como gostaria.

Escrito pelo diretor Rawson Marshall Thurber (do divertido Família do Bagulho) em parceria com Ike Barinholtz e David Stassen, dupla responsável pelo argumento, Um Espião e Meio foca em Calvin Joyner (Hart) e Robbie Wheirditch (Johnson). O primeiro é o aluno mais popular da escola, despontando como alguém que se dará bem na vida, enquanto que o segundo é obeso e alvo de bullying por parte dos colegas, passando por um momento extremamente constrangedor no último dia de aula. Vinte anos depois, Calvin se encontra em uma crise de meia-idade, com sua vida não tendo seguido o caminho que ele imaginava. É quando um Robbie completamente mudado fisicamente ressurge em sua vida sob o nome de Bob Stone e o coloca em uma grande enrascada com a CIA, liderada pela agente Pamela Harris (Amy Ryan).

A dupla central basicamente é a boia em que o filme tenta se segurar para não se afogar. Enquanto Kevin Hart surge um pouco mais contido do que de costume interpretando Calvin como um homem comum que se vê fazendo coisas inimagináveis, Dwayne Johnson se diverte ao trazer certa doçura ao jeito de ser de Bob, criando um contraste engraçado com sua força bruta e habilidades absurdas. Criando personagens que são o oposto um do outro, ambos os atores exibem carisma (detalhe comum de ver em Johnson, mas surpreendente em Hart) e têm uma dinâmica que diverte pontualmente (como na cena da terapia), com Calvin e Bob encontrando um no outro o apoio que precisam para superar possíveis problemas que estejam enfrentando.

É uma pena, porém, que o restante da narrativa não se mostre minimamente cativante ou criativo, tendo um roteiro que fica repetindo suas piadas (como as aparições repentinas de Bob) e que desenvolve uma trama formuláica, clichê e óbvia, mas aparentemente pensando que está concebendo algo de grande frescor. Se os arcos dos protagonistas já são elementos que já soam um tanto batidos e previsíveis, em nada se comparam ao fato de que, ao longo de quase toda a história, o filme mantém a identidade de seu vilão como um grande mistério, o que é ineficaz considerando que podemos antecipar de quem se trata antes mesmo de chegarmos à metade da projeção (e é lamentável ver o talentoso intérprete do personagem ser desperdiçado em um papel tão fraco). Aliás, é impressionante ver o roteiro constantemente tentar enganar o espectador a fim de tornar a trama surpreendente, como ao tentar nos manter em dúvida quanto as reais intenções de Bob. Além disso, é um pouco irritante que tenhamos algumas referências a outros filmes (como Os Bons Companheiros e Matador de Aluguel) e os roteiristas sintam a necessidade de explica-las para que o público as entenda, detalhes que não fazem muita diferença no fim das contas.

Enquanto isso, como diretor, Rawson Marshall Thurber não consegue fazer coisas que compensem os problemas do roteiro. Sendo assim, ele não chega a envolver o público com o ritmo ágil que impõe na maior parte da narrativa, além de se esforçar em criar sequências de ação que buscam causar o riso do público através do absurdo, o que pode até funcionar no confronto que se passa no escritório de Calvin, mas em outros pontos da trama o que toma a tela são sequência burocráticas e sem graça.

No fim, o que se tem em Um Espião e Meio é uma comédia de ação tola e facilmente esquecível. Um filme que se forma a partir de um material excessivamente frágil, que não ajuda a dupla de protagonistas a render uma boa diversão.

Nota:

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Esquadrão Suicida

Considerando que vivemos uma época na qual os filmes de super-heróis são incrivelmente populares, com os estúdios não vendo a hora de fazer esses universos dos quadrinhos culminarem em uma superprodução que reúne seus principais heróis (nisso, o foco fica tanto na Disney/Marvel com Os Vingadores quanto na Warner/DC com a Liga da Justiça), a ideia de um longa como Esquadrão Suicida não deixa de ser curiosa. Focando em um grupo de super-vilões que são postos lado a lado para fazer o bem, o novo trabalho de David Ayer busca seguir os passos de obras como Os Doze Condenados e surge como uma pequena novidade no subgênero, além de dar continuidade ao universo iniciado no eficiente O Homem de Aço e que este ano já rendeu o fraco Batman vs. Superman. No entanto, se tal ideia funciona maravilhosamente nos quadrinhos, aqui acaba encontrando uma série de problemas que a impedem de render um longa minimamente satisfatório, representando mais um ponto baixo no universo cinematográfico da DC Comics.

Com roteiro do próprio David Ayer, Esquadrão Suicida mostra que, depois dos eventos de Batman vs. Superman, o governo americano tenta encontrar uma nova forma de lidar com terroristas, principalmente caso estes sejam poderosos como Superman. Com isso em mente, Amanda Waller (Viola Davis) decide organizar a Força Tarefa X, que consiste em tirar os vilões temporariamente da cadeia e enviá-los para missões perigosas em troca da redução de suas penas. Sob a liderança de Rick Flag (Joel Kinnaman), indivíduos como Pistoleiro (Will Smith), Arlequina (Margot Robbie), Capitão Bumerangue (Jai Courtney), Magia (Cara Delevingne) Crocodilo (Adewale Akinnuoye-Agbaje) e El Diablo (Jay Hernandez) são escolhidos para compor o grupo, e não demora muito até eles serem chamados para salvar o mundo.

Aliás, salvar o mundo de uma ameaça que só existe porque alguém pôs em prática o projeto para iniciar o Esquadrão, o que já dá indícios de que o roteiro de David Ayer não é dos melhores. Na verdade, desde o início, quando começa a apresentar os personagens de maneira episódica, com cenas completamente desconexas umas das outras, e resumindo as habilidades deles com letreiros preguiçosos e descartáveis (afinal, a informação que eles exibem são repetidas em outros momentos), o diretor já revela dificuldades em desenvolver a narrativa de um jeito natural e envolvente, e a própria trama não ajuda muito nisso, se mostrando tola e desinteressante à medida que se desenrola. Além disso, assim como em Batman vs. Superman, Ayer não dá conta de todos os elementos do filme, de modo que a subtrama envolvendo o Coringa (Jared Leto) surge sempre deslocada, servindo mais para encher linguiça do que para realmente acrescentar alguma coisa à narrativa, o que vale também para alguns dos flashbacks que são inseridos ocasionalmente.

Já visualmente, o diretor aposta em uma fotografia acinzentada (que vem sendo padrão dos filmes da DC) durante a maior parte do tempo, impondo um tom vivaz quando o Coringa aparece, o que de certa forma reflete o choque entre a personalidade amalucada do personagem (e que ele compartilha com Arlequina) e as das outras figuras em cena. Mas isso ainda não chega a tornar a narrativa mais interessante, sendo que Ayer ainda falha nas sequências de ação, que se revelam um tanto burocráticas, e o uso pontual que ele faz do slow motion (como quando vemos gotas de chuva escorrendo pelo rosto de um personagem) mais aborrece do que ressalta a tensão desses momentos.

Quanto aos vilões (ou melhor, anti-heróis) que protagonizam a trama, todos são apropriadamente estabelecidos como indivíduos egoístas, loucos e imorais, com seu lado humano entrando em cena apenas quando isso é necessário para a história, algo que não soa orgânico por mais que seus intérpretes sejam esforçados. Isso ocorre também na dinâmica entre eles, que em determinado momento passa a ter uma afetuosidade muito forçada. Mas vale dizer que, em meio a isso, Will Smith ainda exibe carisma interpretando o Pistoleiro, assim como Margot Robbie no papel de Arlequina, sendo uma pena que o filme use a excentricidade da personagem de um jeito bobo na hora de fazer humor. E se Joel Kinnaman e Jay Hernandez conseguem algum destaque como Rick Flag e El Diablo, Jai Courtney é um vácuo na tela interpretando o Capitão Bumerangue, enquanto Adewale Akinnuoye-Agbaje passa batido como Crocodilo e Cara Delevingne não escapa do ridículo como Magia. Fechando o elenco, Viola Davis mostra que sua Amanda Waller é capaz de ser uma figura pior do que muitos vilões, ao passo que Jared Leto cria seu Coringa a partir de trejeitos que nunca parecem naturais, resultando em uma composição fraca e artificial que fica longe dos trabalhos de Heath Ledger em O Cavaleiro das Trevas e de Jack Nicholson em Batman.

Depois da decepção de Batman vs. Superman, havia uma esperança de que Esquadrão Suicida fosse fazer o universo cinematográfico da DC Comics seguir por caminhos melhores. Mas o que se vê mais uma vez é um material de grande potencial ser desperdiçado, e apenas espero que isso não seja um costume no que diz respeito aos filmes da franquia.

Obs.: Há uma cena durante os créditos finais.

Nota: