quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Following

Christopher Nolan é hoje um diretor bastante admirado, que vem construindo uma carreira repleta de grandes filmes. Mas todo cineasta começa em algum lugar, e nem sempre isso ocorre em uma produção de bom orçamento ou com um grande estúdio por trás. Feito a um custo de apenas seis mil dólares, Following é um trabalho que Nolan provavelmente não conseguiria fazer se não tivesse contado com a boa vontade de alguns amigos. Mesmo enfrentando suas limitações, o filme se revelou uma grata surpresa, chamando atenção para seu realizador.

Escrito pelo próprio Nolan, Following acompanha Bill (Jeremy Theobald), um jovem escritor que passa a seguir pessoas na esperança de quebrar um bloqueio criativo. Uma delas é Cobb (Alex Haw), ladrão que, ao perceber o que ele está fazendo, intima o rapaz a acompanhá-lo em suas atividades ilícitas. Quando os dois invadem a casa de uma Loira (Lucy Russell), o protagonista acaba se apaixonando. Tomado pelo sentimento, ele decide conhecê-la melhor, mesmo com as advertências feitas por Cobb, que deixa claro que isso pode trazer problemas.

Um detalhe óbvio, mas ainda assim curioso, no fato de Bill seguir qualquer pessoa é perceber que o ser humano em si é uma criatura fascinante em seus hábitos. Cada indivíduo tem seus próprios compromissos, moradias, hobbies, relacionamentos. E é interessante analisar esse tipo de riqueza que existe em cada um de nós. Essa ação do personagem, de certa forma, encontra reflexo quando ele passa a invadir casas com Cobb, já que o novo parceiro mostra que é possível prever características dos moradores daqueles estabelecimentos só de ver os pertences deles, uma habilidade que ganha ótimos toques quando entram em sua própria casa, fazendo-o com que perceba o quão patética é sua vida.

No entanto, esse aspecto não chega a ser o centro da trama, já que Christopher Nolan realiza aqui um thriller com toques de noir cujo ritmo ágil envolve o espectador durante a maior parte da história. Utilizando uma estrutura não linear (algo que viria ser usado nos futuros trabalhos do realizador), Following começa acompanhando um interrogatório de Bill na polícia, e a partir disso volta no tempo para mostrar como ele se envolve com Cobb, pulando aos poucos para eventos que são consequência dessa parceria. É um grande quebra-cabeça que soa confuso inicialmente, mas gradualmente as peças se encaixam, montando uma trama repleta de reviravoltas surpreendentes em uma narrativa conduzida com segurança pelo diretor, que consegue criar um cativante clima de suspense entre os personagens.
Enquanto isso, Jeremy Theobald traz um jeito de homem comum que combina bem com Bill, além de lhe conferir uma insegurança que o aproxima do espectador. Nesse aspecto, o Cobb de Alex Haw é o oposto, praticamente ditando como as coisas devem acontecer. Aliás, é notável a influência que ele tem no protagonista, que até substitui o visual precário que tem inicialmente pela elegância típica do parceiro. Já Lucy Russell surge como o ponto fraco do elenco, não conseguindo fazer com que sua Loira se torne uma femme fatale interessante, o que é lamentável considerando a importância que ela acaba tendo na trama.
É verdade que Following enfrenta alguns problemas. Nolan é um tanto desajeitado em determinadas cenas (como em uma briga que ocorre no final do segundo ato) e os fades que dividem a estrutura do roteiro às vezes quebram o ritmo da trama. Mas é um filme eficiente ao longo de seus rápidos 68 minutos de duração, apresentando com propriedade o talento de um diretor que desde então amadureceu muito na arte de contar histórias.
Nota:

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Ajuste Final

Donos de uma filmografia riquíssima, os irmãos Joel e Ethan Coen sempre mostraram habilidade invejável para transitar entre gêneros diferentes, criando obras notáveis e que nunca deixaram de ter as marcas de seu cinema. Logo no início da carreira, a dupla apareceu com o eficiente thriller Gosto de Sangue, partindo depois para o divertidíssimo Arizona Nunca Mais. Para confirmar de vez seus talentos, realizaram este Ajuste Final, um filme de gângster que não só faz jus aos melhores do gênero, mas que também funciona como belíssimo estudo de personagem.

Ajuste Final se passa na época da Lei Seca e foca conflitos entre as máfias locais de uma cidade americana. Nesse contexto, o chefe do crime, Johnny Caspar (Joe Polito), avisa seu rival, Leo O’Bannon (Albert Finney), que pretende matar o apostador Bernie Bernbaum (John Turturro), em virtude de trapaça. Apesar de ter o apoio de seu conselheiro, Tom Regan (Gabriel Byrne), Leo decide proteger Bernie, já que se trata do irmão de sua namorada, Verna (Marcia Gay Harden), ela que mantém um caso com Tom. Tal decisão dá início a uma guerra e Tom passa a tentar manter a paz entre os dois chefões, ainda que isso venha a afetar seus próprios interesses.
Assim, os Coen apresentam um mundo de traições e desconfianças, repleto de figuras desprezíveis, onde não há espaço para ingenuidade, covardia e nem mesmo para amizades. Este último aspecto, por sinal, parece até importante, mas não passa de uma ilusão, porque no final das contas os negócios sempre vêm em primeiro lugar. Ninguém pode ficar por baixo nesse universo corrupto, e isso rege boa parte dos atos dos personagens frios e calculistas que guiam a trama e tornam a experiência de assistir a Ajuste Final tão fascinante.
Tudo é comandado com elegância pelos Coen (sim, o filme é reconhecidamente dirigido pelos dois, mesmo com Ethan não sendo creditado na função ao lado do irmão, como passaria a ser a partir de Matadores de Velhinha). Em determinados momentos, eles demonstram prezar bastante pela sutileza. Quando um personagem é socado escada abaixo, por exemplo, a ideia de que ele está sendo rebaixado é perceptível sem grandes alardes. Além disso, é interessante ver o contraste que os Coen criam entre o que se vê geralmente na tela e o tom às vezes melancólico (apesar da violência que acompanhamos), o que até pode ser creditado em boa parte à fantástica trilha de Carter Burwell. Para completar, é admirável como os irmãos cineastas impõem um visual que faz a narrativa lembrar constantemente os filmes noir, seja pela impecável recriação de época feita pelo design de produção ou pelo belo jogo de luzes da fotografia de Barry Sonnenfeld.
Enquanto isso, o elenco é irrepreensível em suas composições. O veterano Albert Finney interpreta Leo como uma figura de autoridade e inteligência inquestionáveis, algo que fica claro desde sua primeira cena. O momento em que ele escapa de um atentado é, sem dúvida, um dos melhores do filme. Já o excelente Jon Polito aposta em uma ansiedade que de certa forma torna seu Johnny Caspar o oposto de Leo, já que enquanto este se sente seguro em seu poder, aquele deve correr mais um pouco para alcançá-lo. E se Marcia Gay Harden se destaca ao tornar Verna uma mulher forte e que beira a femme fatale, John Turturro brilha ao fazer de Bernie um homem bobo por almejar mais coisas do que deveria, mas cujos atos ainda assim se revelam imprevisíveis.
Mas o grande nome do filme é mesmo Gabriel Byrne que, como o protagonista Tom Regan, surge como a figura mais íntegra da galeria apresentada pelos Coen ao longo da história. Tom mostra ter a ética que Johnny Caspar logo no início diz tanto valorizar. Mesmo que aja como um verdadeiro anti-herói, isso não o impede de ser o único a demonstrar sentimentos por outras pessoas, como Leo e Verna. Sem falar que seu arco dramático é muito bem desenvolvido, detalhe evidente em duas cenas específicas e aparentemente iguais envolvendo Bernie, mas que têm resultados diferentes. Byrne encarna o personagem com a sensibilidade que ele merece, em uma das melhores atuações de sua carreira.
Impressionante em todos os sentidos, Ajuste Final se estabelece facilmente como uma das obras-primas dos irmãos Coen. Aliás, este é um elogio considerável se levarmos em conta que a dupla vem conseguindo manter a genialidade vista nesse início de carreira durante a maior parte de sua filmografia, algo que chegaria ao ápice no premiadíssimo Onde os Fracos Não Têm Vez. O que, convenhamos, é digno de aplausos.
Nota:

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Debi & Lóide 2

Quando um bom filme faz sucesso e sua desejada continuação fica vários anos no limbo sem ser desenvolvida, algumas dúvidas pairam no ar. É realmente válido trazer os personagens em uma nova história ou seria melhor deixá-los quietos, já que estariam saindo por cima? Debi & Lóide passou por isso. Apontada por muitos como uma das melhores comédias da década de 1990, o longa em vários momentos pareceu estar prestes a ganhar uma continuação, mas esta nunca ia pra frente (deixemos o prequel lançado em 2003 no esquecimento que merece). No entanto, 20 anos depois, Jim Carrey e Jeff Daniels finalmente retornam aos seus famosos personagens neste Debi & Lóide 2, novamente sob o comando dos irmãos Peter e Bobby Farrelly. E é um alívio poder dizer que a espera valeu a pena e quaisquer receios com relação ao projeto foram em vão.

Escrito pelos próprios diretores em parceria com Bennett Yellin (que contribuiu no primeiro filme), Mike Cerrone, Sean Anders e John Morris, Debi & Lóide 2 coloca Lloyd Christmas (Carrey) e Harry Dunne (Daniels) voltando a conviver juntos depois de o primeiro pregar uma peça épica no amigo. Eles então descobrem que a antiga namorada de Harry, Fraida Felcher (Kathleen Turner), teve uma filha com ele e a deu para adoção. Considerando que Harry está precisando de um transplante de rim e a garota, Penny (Rachel Melvin), pode ser a única doadora compatível, a dupla parte em uma viagem para encontrá-la. Obviamente, causam confusões homéricas pelo caminho, principalmente quando se envolvem com o pai adotivo dela, Dr. Pinchelow (Steve Tom), cuja esposa, Adele (Laurie Holden), quer tirá-lo de circulação para ficar com a herança.
Debi & Lóide 2 segue mais ou menos a mesma fórmula usada anteriormente, usando uma estrutura de road movie em sua história e chegando a repetir situações e piadas. De certa forma, isso pode denotar alguma falta de criatividade por parte dos roteiristas. Mas a verdade é que não chega a incomodar tanto, servindo como base para que as sacadas do roteiro divirtam em sua maioria. É bacana e até mesmo nostálgico ver Lloyd e Harry fazendo as patetices com as quais nos acostumamos, provando que são mais estúpidos do que imaginávamos, o que não poderia ser mais apropriado (o que dizer, por exemplo, do caminho que fazem para ver os pais de Harry?). Além disso, o roteiro não deixa de prestar homenagens ao longa original, trazendo de volta elementos conhecidos daquele universo, como a van canina dos protagonistas e o vizinho cego Billy (Brady Bluhm), que novamente vira alvo de piadas hilárias.
Jim Carrey e Jeff Daniels retomam admiravelmente a química entre seus personagens, algo que se não acontecesse certamente faria o projeto perder sua razão de ser. Se as piadas funcionam, isso se deve à incrível inocência adotada pelos atores ao encarnarem seus personagens, agindo como se a estupidez deles fosse perfeitamente normal diante das outras pessoas. A reação deles a uma revelação sobre sexo, por exemplo, é engraçada exatamente por estarmos falando de duas crianças grandes. Aliás, a dupla é tão parada em sua imaturidade que usa exatamente as mesmas roupas de adolescente do primeiro filme, e se lá elas já soavam deslocadas, aqui isso é ainda mais perceptível – afinal, estamos falando de dois homens de meia-idade.
Debi & Lóide 2 não é excepcional como seu antecessor. Seria surpreendente se isso acontecesse. Mas é um filme bem sucedido não só em suas tentativas de causar o riso do público ao longo da projeção, mas também em tornar prazeroso rever seus cativantes protagonistas, que definitivamente não mudaram nada nestas duas décadas.
Obs.: Há uma cena depois dos créditos finais.
Nota:

Debi & Lóide: Dois Idiotas em Apuros

Debi & Lóide deve ser um dos filmes mais subestimados da década de 1990. Claro que esta estreia dos irmãos cineastas Peter e Bobby Farrelly tem vários admiradores, mas é uma comédia que não parece ser referenciada como uma obra-prima, um clássico do gênero. No entanto, está mais do que na hora de dar o devido crédito a esse filme. Mesmo não sendo inovador e contando com um humor que pode soar idiota (ao menos à primeira vista), Debi & Lóide acaba representando uma experiência absolutamente hilária ao colocar o público em frente a duas figuras que não poderiam ser mais estúpidas.

Escrito pelos Farrelly em parceria com Bennett Yellin, Debi & Lóide acompanha as desventuras dos amigos fracassados Lloyd Christmas (Jim Carrey) e Harry Dunne (Jeff Daniels), que decidem atravessar o país até as montanhas gélidas de Aspen, no Colorado. O objetivo: devolver a maleta que Mary Swanson (Lauren Holly), mulher por quem Lloyd se apaixonou, teria esquecido no aeroporto antes de viajar. O que eles não sabem é que tal maleta deveria concluir uma transição entre Mary e alguns bandidos, que passam então a ficar no encalço da dupla ao longo de toda sua jornada.
Há comédias que disparam piadas para todos os lados e acertam muito pouco (ou até mesmo nada). Há outras que conseguem divertir, mas deixam algum espaço entre as risadas que causa. E há aquelas que fazem o espectador gargalhar constantemente durante sua história. Debi & Lóide se encaixa facilmente neste último tipo. Os irmãos Farrelly exploram com eficiência as personalidades de seus dois protagonistas em todas as sacadas do roteiro. Nisso, eles apostam em um humor que vai desde tiradas rápidas (a cena em que Lloyd comemora a chegada do homem à lua), passando por gags politicamente incorretas (como aquela envolvendo o periquito presenteado a um menino cego, uma das melhores do filme) e chegando ao ponto de brincar com informações que são de conhecimento do público, mas não dos personagens (o policial bebendo uma “cerveja”).
Mas Debi & Lóide não é admirável apenas por suas piadas inspiradas, pois do ponto de vista de estrutura ele também é exemplar, tendo um roteiro que não apresenta uma série de elementos secundários à toa. Em vários momentos, são inseridos no filme personagens e certas informações que inicialmente aparentam cumprir rapidamente sua função na narrativa, ou simplesmente não soam tão importantes. Mas quando voltam a ganhar atenção, não só pegam o espectador de surpresa, como também o fazem rir pela forma como são usados (as corujas que surgem em determinada cena são exemplo disso).
Só que o filme provavelmente perderia forças caso a dupla de protagonistas não fosse tão interessante. Por sorte, Jim Carrey (que na época fazia da comédia seu principal nicho e chegava estrelato absoluto com o sucesso de Ace Ventura e O Máskara) e Jeff Daniels (ator que sempre transitou bem entre vários gêneros) encarnam Lloyd e Harry com uma divertida ingenuidade, tendo ainda uma dinâmica excepcional e um carisma que nos faz simpatizar com eles rapidamente. A grande camaradagem entre os dois é a alma de Debi & Lóide, sendo curioso notar como eles se completam à sua própria maneira, como pode ser visto, por exemplo, quando um mostra não saber ler direito, fazendo o outro dizer o que está escrito em um jornal.
Quando uma comédia é realmente boa, tendemos a rir de suas piadas sempre que a revisitamos ao longo dos anos, não importa quantas vezes façamos isso. No caso de Debi & Lóide se passaram exatos 20 anos e o filme mesmo assim é capaz de causar ataques de risos como se o víssemos pela primeira vez. É outra prova de como ele é bem sucedido dentro de tudo o que almeja – como se ainda precisasse de mais uma evidência disso.
Nota:

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Interestelar

A curiosidade é responsável por boa parte dos grandes passos dados pelo homem em termos tanto de conhecimento quanto de evolução. É o que nos faz querer explorar o desconhecido, por mais estranho que este possa parecer, e cada nova descoberta nos deixa naturalmente mais instigados. Interestelar, novo filme do diretor britânico Christopher Nolan, apresenta um mundo que precisa urgentemente deste tipo de curiosidade, e o que vemos na tela é uma jornada que, apesar de não ser desprovida de problemas, se revela intrigante e tecnicamente brilhante.

Escrito pelo próprio Christopher Nolan em parceria com seu irmão Jonathan, Interestelar se passa em um futuro próximo, apresentando um planeta Terra cada vez mais escasso e que consequentemente está colocando toda a raça humana em risco. Nessa realidade, entra em cena o engenheiro e ex-piloto Joseph Cooper (Matthew McConaughey), que descobre que a NASA tem realizado expedições com o propósito de encontrar outro planeta para ser habitado pelas pessoas, em um projeto liderado pelo Professor John Brand (Michael Caine). É então que Cooper aceita a proposta de se juntar a filha de Brand, Amelia (Anne Hathaway), e liderar a equipe que fará a viagem que explorará os confins do universo, indo além de buracos negros e “buracos de minhoca” para definir o futuro de todos, mesmo que isso o faça deixar seus filhos Murph e Tom (Mackenzie Foy e Timothée Chalamet, respectivamente) para trás sem perspectiva de retorno.

A maior parte da primeira hora de projeção é dedicada para que Christopher Nolan estabeleça a realidade na qual estamos embarcando e apresente elementos que, ao longo da narrativa, servirão como uma espécie de guia para o desenvolvimento das ideias complexas que permeiam a história, o que é feito de maneira orgânica pelo roteiro ainda que inevitavelmente renda sua parcela de diálogos expositivos. Dessa forma, ficamos sabendo não só sobre os planos que John Brand tem para a colonização de outros planetas, mas também que as pessoas parecem estar meio que em um estado de retrocesso, negando algumas de suas maiores conquistas, como a chega do homem à lua. Nesse sentido, não deixa de ser irônico que a aposta para a salvação da humanidade seja exatamente uma exploração espacial. Para completar, ao mostrar que o ambiente na Terra fica revestido de pó, o diretor passa a ideia de um lugar ultrapassado, em um simbolismo curioso e adequado à trama.

É então que a viagem dos personagens tem início e Nolan passa a montar um filme que faz jus ao gênero de ficção científica, com seus conceitos investindo ora no existencialismo, ora no moralismo, passando pela própria natureza humana e trazendo até mesmo o espaço-tempo como um componente importante de toda a equação. Aliás, a relação que Interestelar tem com o tempo é um de seus pontos mais interessantes. O fato de minutos em outro planeta poderem significar anos na Terra adiciona um triste peso ao arco dramático de Cooper, que se vê perdendo a chance de ver seus filhos crescerem (quando adultos eles passam a ser interpretados por Jessica Chastain e Casey Affleck), além de criar uma tensão muito eficiente considerando que perder tempo é a última coisa que o protagonista e os membros de sua equipe querem. É um detalhe que torna eletrizante, por exemplo, a sequência que se passa em um planeta com ondas gigantes.

Tudo isso somado a sua escala absolutamente grandiosa faz de Interestelar uma bela experiência cinematográfica, e assisti-lo em uma sala IMAX expande isso consideravelmente. O design de produção de Nathan Crowley, com o auxílio dos impressionantes efeitos visuais, dá atenção aos mínimos detalhes das naves, “buracos de minhoca” e tudo o que vemos no espaço, sendo hábil também ao trazer certa precariedade a Terra futurista, que ainda assim se mantém como um lugar esteticamente mais cativante do que os outros planetas que vemos na história. Em meio a isso, é perceptível a influência que 2001: Uma Odisseia no Espaço tem no filme, algo que pode ser visto pelo modo como Christopher Nolan comanda determinadas sequências no espaço, além de elementos como o robô que ajuda os personagens nas expedições (uma mistura de HAL 9000 com um monólito) e a trilha de Hans Zimmer, que em alguns acordes lembra “Also Sprach Zarathustra” e dita bem o ritmo da narrativa.

Enquanto isso, o excelente Matthew McConaughey encarna Cooper com sua competência habitual, criando um personagem determinado e que tem na relação com os filhos (Murph em especial) seu lado mais vulnerável, e até por isso a cena em que ele chora ao ver uma mensagem deles é um momento particularmente tocante do filme. Já Murph é interpretada por Jessica Chastain com uma compreensível amargura, mas que não a impede de se manter conectada ao que seu pai está fazendo, vindo a ser uma pupila do Professor Brand, que tem em Michael Caine um intérprete que estabelece sua importância e inteligência desde o princípio. E se Anne Hathaway e Casey Affleck não tem muitas chances para tornar Amelia e Tom interessantes, detalhe que se deve mais ao modo um tanto raso com que o roteiro os desenvolve, o ator que interpreta um certo Dr. Mann (e que prefiro não revelar aqui) consegue subverter bem as expectativas do público considerando os tipos de papeis que ele costuma aceitar.

Mas mesmo com todas suas qualidades, Interestelar encontra problemas que o impedem de ser outra obra-prima do currículo Christopher Nolan. A cena em que Amelia e Cooper discutem como o amor transcende o espaço-tempo, por exemplo, não se encaixa direito na trama, talvez por o diretor tratar esse assunto com muito mais racionalidade do que sensibilidade, o que é uma pena se levarmos em conta que isso é importante para a narrativa. E apesar de o roteiro conseguir criar uma lógica interna que faz funcionar coisas absurdas do terceiro ato, é inegável que algumas delas ainda soam forçadas, caindo até no bom e velho deus ex machina.

Interestelar não é o melhor filme do ano e muito menos o melhor de Christopher Nolan, mesmo representando seu trabalho mais ambicioso por tudo o que explora. Mas no fim ainda é um ponto positivo para o diretor, sendo uma ficção científica admirável durante suas quase três horas de duração, não ficando no lugar-comum e se mostrando repleta de grandes momentos.

Nota:

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

November Man: Um Espião Nunca Morre

Depois de estrelar quatro filmes como James Bond na franquia 007, Pierce Brosnan ficou meio longe dos thrillers de espionagem, se dividindo entre outros gêneros que vão da comédia até a fantasia. Mas o ator retorna ao nicho no qual obteve mais sucesso neste November Man: Um Espião Nunca Morre, thriller comandado por Roger Donaldson, diretor com quem o astro trabalhou no já esquecido O Inferno de Dante. E apesar de problemático, a nova parceria dos dois resulta em uma obra razoável, em parte exatamente por causa da presença de Brosnan.

Baseado no livro de Bill Granger, o roteiro escrito por Michael Finch e Karl Gajdusek se concentra em Peter Deveraux (Brosnan), agente da CIA que se aposenta depois que uma de suas missões termina tragicamente graças a um erro de seu então pupilo David Mason (Luke Bracey). Anos depois, Deveraux é chamado por seu superior, John Henley (Bill Smitrovich), para ajudar na fuga de uma informante que conseguiu provas de que o presidente eleito da Rússia, Arkady Federov (Lazar Ristovski), é um criminoso de guerra. Mas as coisas não saem como planejado e a CIA fica no encalço de Deveraux, que com o auxílio da assistente social Alice Fournier (Olga Kurylenko) passa a tentar desmantelar toda a conspiração por trás do que está acontecendo, ao passo que Mason é enviado para eliminá-lo.

Inicialmente, November Man aparenta ter potencial para render um belo filme, mas à medida que avançamos na narrativa ele vai caindo com facilidade em uma sucessão de clichês, além de perder um pouco o foco da história de vez em quando. Isso ocorre até por o roteiro inserir muito mais peças do que é capaz de lidar em seu jogo de gato e rato, numa possível tentativa de deixar a trama mais complexa. Mesmo assim, o clima conspiratório imposto por Roger Donaldson funciona bem, o que impede o filme de ser aborrecido, envolvendo o espectador durante a maior parte do tempo. Mas se nesse aspecto o realizador acerta, o mesmo não pode ser dito sobre o modo como ele conduz as cenas de ação, que se revelam burocráticas em sua maioria, não tendo nada de especial.

Assim, o atrativo absoluto do filme acaba sendo Pierce Brosnan, que surpreende ao encarnar Peter Deveraux com uma intensidade que pouco tem se visto em seus trabalhos recentes. Com uma presença admirável em cena, Brosnan faz do protagonista uma figura cuja autoridade e experiência ficam evidentes logo de cara, sem falar que é curioso ver que ele se mostra disposto a machucar pessoas inocentes para atingir alguém que vê como inimigo. E a relação de Deveraux com Mason (interpretado com segurança por Luke Bracey) chama atenção pelo respeito que eles claramente têm um pelo outro, mesmo estando em lados opostos. No entanto, é uma pena isso não reflita na dinâmica dele com Alice Fournier, personagem que a bela Olga Kurylenko faz o possível para tornar interessante, apesar de o roteiro não ajudá-la muito.
Se equilibrando entre acertos e erros, November Man é um filme que até pode entreter enquanto durar. Mas é o tipo de produção que passa despercebida por não fazer nada muito memorável em termos narrativos.

Nota: