quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

O Voo

Robert Zemeckis ficou toda a década passada se dedicando a animações em motion capture (os resultados foram o excepcional O Expresso Polar, o mediano A Lenda de Beowulf e o ótimo Os Fantasmas de Scrooge). Mas agora o diretor finalmente volta aos filmes live action neste O Voo, e é bom ver o diretor que nos presenteou com obras como a trilogia De Volta Para o Futuro e Forrest Gump retornar a esse campo. Apesar de não ser um dos melhores filmes do cineasta, O Voo consegue prender a atenção graças ao trabalho de outro grande nome que há algum tempo não aparecia tão bem: Denzel Washington.
Escrito por John Gatins, O Voo conta a história de William “Whip” Whitaker (Washington), piloto que tem problemas com drogas e, principalmente, álcool. Durante um voo aparentemente normal, falhas técnicas fazem o avião cair rumo a uma tragédia, mas Whip surpreendentemente consegue pousá-lo sem muitos danos e salvando quase todas as pessoas a bordo (algo que nenhum outro piloto conseguiu repetir com sucesso em simulações). Ao mesmo tempo em que seu alcoolismo piora, Whip tem que lidar com a investigação do acidente, já que é revelado que ele estava “ligado” no momento do pouso, e todos querem saber o que realmente aconteceu.
Logo na primeira cena do filme, Whip acorda em um quarto de hotel e ao atender sua ex-esposa no telefone precisa beber um gole de cerveja para prestar a atenção no que ela está dizendo. Dessa forma, o roteiro de Gatins já consegue deixar bem estabelecida a gravidade da dependência do personagem. E mesmo assim, Whip mostra ser um piloto extremamente competente, algo que fica claro não só pelo modo como ele pousa o avião, mas também quando ele se livra de uma turbulência com segurança absoluta. Esses detalhes tornam Whip um personagem muito intrigante, a ponto de a história ser envolvente exatamente por manter uma grande curiosidade quanto ao que vai acontecer com ele diante das investigações e seu vício.
Não é à toa que o roteiro perde muito de sua força sempre que tenta focar algum outro personagem, como Nicole (Kelly Reilly, em uma atuação convincente), mulher que Whip conhece no hospital e tenta se recuperar de seu vício em drogas. Aliás, Gatins tenta criar um paralelo entre os dois personagens, sendo eles duas figuras que iniciam um relacionamento ao mesmo tempo em que tentam lidar com suas dependências. Mas a verdade é que esse elemento nunca se mostra tão interessante, e considerando que Nicole ganha muita atenção inicialmente apenas para depois ser deixada de lado a partir de determinado momento, isso acaba servindo mais para desviar a atenção daquilo que realmente importa e deixar a duração do filme desnecessariamente inchada. O roteirista ainda procura investir no humor, usando principalmente o amigo de Whip, Harling Mays (interpretado por John Goodman), em uma pequena participação como o alívio cômico da história (mais um para a carreira do ator). No entanto, diante do tom sério do filme, todas as tentativas acabam destoando demais da narrativa, o que é uma pena.
Mas o que brilha em O Voo é mesmo Denzel Washington e seu retrato do alcoolismo de Whip. Washington faz dele um personagem que por mais que passe quase todo o filme negando ter um vício, tem total consciência de sua condição. Mais do que isso, tem vergonha desse problema, algo indicado pelos momentos em que ele olha para os lados antes de pegar uma garrafa, procurando se certificar que ninguém está o vendo. Além disso, em vários momentos o ator gagueja bastante, o que só deixa mais claro o quanto Whip está perdido em meio a sua condição. Quando esta em cena, Washington domina a tela admiravelmente, mostrando total controle sobre seu personagem.
Enquanto isso, Robert Zemeckis conduz o filme com seu talento habitual durante a maior parte do tempo, tratando com cuidado a progressiva autodestruição do protagonista. Mas é mesmo o acidente aéreo que representa o melhor momento do filme. Tensa e muito bem orquestrada por Zemeckis, que consegue acompanhar o pânico dos passageiros ao mesmo tempo em que mostra os esforços de Whip e sua tripulação para tentar evitar um desastre, a cena se coloca entre os melhores momentos da carreira do cineasta, e chega a ser uma pena que ela ocorra com menos de meia hora de projeção. Também é interessante notar como Zemeckis constrói o ambiente claustrofóbico em que o protagonista se encontra em meio a uma audiência, filmando-o quase o tempo todo com planos fechadíssimos. No entanto, é uma pena que o diretor procure demais arrancar algumas lágrimas do público a partir de determinado momento no terceiro ato da trama.
Mesmo com seus problemas, O Voo ainda consegue ser um belo filme, representando um bom retorno de Robert Zemeckis ao live action. Só espero que não precisemos aguardar mais doze anos até que o diretor lance um novo trabalho nesse formato.
Cotação:

Um comentário:

Marcelo Keiser disse...

Estou ansioso para ver esse filme. Denzel sempre é garantia de um bom programa!

abraço