(Crítica originalmente publicada no Papo de Cinema)
Filme que finaliza a chamada “Trilogia da Morte” de Gus Van Sant, Últimos Dias, assim como seus antecessores (Gerry e Elefante), apresenta uma história ficcional inspirada numa tragédia real, seguindo os momentos que antecedem a respiração final de seus personagens. Aqui, ele acompanha os últimos dias de vida de um músico claramente baseado em Kurt Cobain, morto em 1994. No entanto, o fato do roteiro ser apenas fundamentado no líder do Nirvana dá uma liberdade interessante a Van Sant para desenvolver os eventos. E se não chegamos a ver a vida de Cobain, sobretudo como ela foi na reta final, acabamos tendo uma versão do que leva alguém como ele a morrer tão precocemente.
Filme que finaliza a chamada “Trilogia da Morte” de Gus Van Sant, Últimos Dias, assim como seus antecessores (Gerry e Elefante), apresenta uma história ficcional inspirada numa tragédia real, seguindo os momentos que antecedem a respiração final de seus personagens. Aqui, ele acompanha os últimos dias de vida de um músico claramente baseado em Kurt Cobain, morto em 1994. No entanto, o fato do roteiro ser apenas fundamentado no líder do Nirvana dá uma liberdade interessante a Van Sant para desenvolver os eventos. E se não chegamos a ver a vida de Cobain, sobretudo como ela foi na reta final, acabamos tendo uma versão do que leva alguém como ele a morrer tão precocemente.
Últimos Dias se concentra em Blake (Michael Pitt), músico que claramente perdeu quaisquer propósitos de sua vida, não conseguindo arrancar muitos prazeres dela. Nadar livremente em um rio, por exemplo, já não é relaxante, representando apenas mais um vazio. “Eu perdi algo no caminho para onde quer que eu esteja hoje”, ele diz. Vagando por uma floresta ou por sua mansão sem destino certo, até porque não há mais nenhum, Blake se isola, evitando as pessoas ao seu redor e se entregando ao cansaço e à pressão que sente, seja da fama, das drogas ou até de si mesmo.
Investindo quase sempre em planos longos (e até planos-sequência) para contar a melancólica jornada de Blake, Gus Van Sant desenvolve uma narrativa cujas cenas têm uma dinâmica natural, passando uma interessante impressão de realismo, marca registrada, por exemplo, em Elefante, do qual ele resgata a técnica de mostrar cenas por mais de um ângulo. Assim, Van Sant consegue explorar não só a visão do protagonista, mas também a de seus amigos, como agem e se sentem com relação a ele, criando um retrato um pouco mais completo de seu universo. Além disso, a decisão do diretor de manter a câmera afastada de Blake na maior parte do tempo se revela inteligente, pois serve para limitar nossa entrada em seu mundo, detalhe que, somado à proporção de tela utilizada (1.37:1), contribui para sua introspecção.
Blake está exausto. Nada do que surge em seu caminho chama a atenção, seja a fala de um representante das Páginas Amarelas ou um amigo colocando deliberadamente a mão em seu bolso e pegando seu dinheiro. Para a filha pequena ele já disse o que precisava, mesmo que tenha sido pelo telefone. Na verdade, Blake está mais que exausto. Ele já está morto, mas à espera do trem definitivo rumo ao infinito (se este existir). A atuação do talentoso Michael Pitt é essencial para que as emoções do personagem fiquem sempre claras. Praticamente sem poder utilizar o rosto para sua composição, já que ele constantemente fica escondido por seu cabelo e Van Sant faz questão de não fazer close ups, Pitt tem em seu jeito avoado e sonolento, que inclui postura encurvada e voz arrastada, seu principal instrumento para transmitir os sentimentos de Blake, algo que ele usa com extrema competência. E o fato do personagem aparecer murmurando coisas para si mesmo mostra o quanto ele parece reprimir os próprios pensamentos, liberando-os apenas quando canta. Sendo assim, seus dois momentos musicais se destacam, representando desabafos libertadores.
Gus Van Sant não busca fazer grandes reflexões com a jornada de Blake (ou Kurt Cobain, se preferirem), e isso não é particularmente necessário. Seguir o personagem em sua espera quase silenciosa pelo inevitável acaba sendo o suficiente para formar uma história com grande peso emocional. Como resultado, Último Dias revela-se um trabalho consistente na carreira de seu diretor.
Nota:
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