Que Jodie Foster é uma atriz
fabulosa isso é inegável, mas pouco se comenta sobre seu trabalho atrás das
câmeras. Desde que estreou na direção de longas-metragens em 1991, com o
eficiente drama Mentes Que Brilham,
Foster tem mostrado uma segurança admirável na função, o que não deixa de
refletir aquilo que ela geralmente exibe como intérprete. Jogo do Dinheiro, seu quarto filme, se apresenta como algo
diferente do que ela havia comandado no cinema até agora. Se antes Foster
estava marcando seu território com dramas e comédias (além de seu já citado
filme de estreia, ela também fez o divertido Feriados em Família e o ótimo Um
Novo Despertar), agora ela se vê nas rédeas de um thriller que faz jus ao
gênero e que, na essência, foca um grito desesperador resultante tanto da
sujeira que pode mover o mercado financeiro quanto da irresponsabilidade da
mídia.
No filme, cujo roteiro é escrito
por Jamie Linden em parceria com Alan DiFiore e Jim Kouf, George Clooney
interpreta Lee Gates, apresentador do programa Money Monster, onde ele trata das
ações do mercado e dá dicas ao público quanto aos melhores investimentos,
cuidando do show com o auxílio de sua produtora executiva Patty Fenn (Julia
Roberts) nos bastidores. A história mais badalada da vez é a da IBIS Global
Capital, empresa presidida por Walt Camby (Dominic West) e que, depois de
parecer uma aposta segura no mercado, fez seus acionistas perderem uma enorme
quantia em dinheiro. Um deles é o jovem Kyle Budwell (Jack O’Connell), que invade
o programa ao vivo, fazendo Lee e sua equipe de reféns enquanto exige saber exatamente
o que aconteceu.
Logicamente, Kyle não é visto
como o vilão da história aqui, mas sim uma vítima, representando uma parcela da
sociedade que está cansada de ser passada para trás por figuras poderosas, que
brincam com dinheiro pensando em si próprios e ignoram a possibilidade de prejudicar
alguém. O plano do personagem é uma medida extrema, sem dúvida, mas acaba
servindo como catalizador para que o roteiro possa destrinchar o jogo de
mentiras e irresponsabilidades por trás da história, aproveitando também para
abordar o papel da mídia no meio disso tudo, seja ao focar as consequências da
desinformação ou a própria relação do público com aquilo que lhe é oferecido na
televisão, não esquecendo o fato de a audiência parecer ter um interesse
especial em acompanhar situações tensas/trágicas, arranjando nelas uma estranha
diversão.
Esses detalhes são desenvolvidos
admiravelmente por um roteiro que revela ser muito bem estruturado, apesar de não
escapar de clichês e ser expositivo em alguns momentos (quando os personagens
trocam diálogos que beiram o incompreensível devido aos termos do mercado
financeiro, é possível prever que teremos uma fala que simplificará a conversa).
Desde o início é possível perceber que seus autores sabem que direção dar a
trama e aos personagens, e nisso o filme até exibe uma ironia interessante,
trazendo Patty dizendo “Nós não fazemos jornalismo” em uma cena no início
apenas para que ela, Lee e toda a equipe do Money Monster sejam obrigados a fazer
exatamente isso no decorrer da história, investigando a fundo a “pane” sofrida
pela IBIS, com uma pista levando a outra. Sendo assim, vale ressaltar que o
fato de todas as peças importantes do quebra-cabeça serem apresentadas de
antemão para o público (os núcleos situados fora dos Estados Unidos, por
exemplo) ajuda a fazer com que a narrativa se construa com naturalidade à
medida que avançamos na trama.
No comando de tudo isso, Jodie
Foster começa em um tom mais descontraído para nos introduzir ao universo do
Money Monster, onde as informações vêm acompanhadas de apresentações
espalhafatosas por parte de Lee Gates (por sinal, suas danças só não são
constrangedoras porque o filme tem noção do quão ridículas elas são). De certa
forma, isso contribui para intensificar o choque consequente da seriedade que passa
a reger a narrativa a partir do momento em que Kyle aparece em cena. É então
que Foster mostra habilidade para impor um tom crescente de urgência aos
acontecimentos do filme, criando assim uma constante atmosfera de tensão que,
somada a montagem ágil de Matt Chessé e a trilha de Dominic Lewis, acaba prendendo
a atenção do espectador do início ao fim. Além disso, é bacana ver que a
diretora consegue manter um bom ritmo ao longo do filme mesmo tendo que lidar
com vários núcleos narrativos simultaneamente, pulando de um a outro organicamente
sempre que preciso, e o trabalho de montagem novamente merece destaque aqui.
Para completar, Foster tem sorte
de contar com um elenco imensamente talentoso. No papel de Lee Gates, George
Clooney surge com seu carisma habitual, interpretando um homem cuja arrogância parece
cegá-lo quanto ao seu trabalho e sua própria imagem pública, algo que não
impede o roteiro de dar ao ator a chance de explorar a humanidade do sujeito a
partir de sua vulnerabilidade, e ele faz isso maravilhosamente. Já Julia
Roberts faz de Patty a figura mais segura e determinada em cena, sendo que ela
tem uma dinâmica admirável com o personagem de Clooney ainda que eles estejam
constantemente afastados um do outro, enquanto que Dominic West encarna
eficientemente a canalhice de Walt Camby. Mas é Jack O’Connell (ator que vem
chamando bastante atenção ultimamente) quem praticamente rouba o filme com a
intensidade que traz ao desespero de Kyle, com quem o público é capaz de se
identificar por mais que seus atos provem ser reprováveis, o que ocorre tanto
pelas motivações dele quanto pelo jeito um tanto amedrontado e inseguro estabelecido
por seu intérprete.
A ficção mostrada por Jodie
Foster em Jogo do Dinheiro dialoga
bem com coisas que acontecem na realidade, como se vê no recente A Grande Aposta, que dá uma aula sobre
a sujeira no mercado financeiro e o impacto que isso pode causar. Só espero que
não seja necessário que pessoas surtem violentamente para termos uma chance de
trazer verdades à tona, expor os corruptos e, assim, reparar injustiças. Seria deprimente
ver o caos chegar a esse ponto.
Nota:
Nenhum comentário:
Postar um comentário