A teoria de que nós usamos apenas
10% de nossos cérebros rende várias discussões, em parte por ela explicar o
fato de muitas pessoas não realizarem tantas coisas quanto poderiam. Mesmo que
na prática quase todos os especialistas digam que se trata de uma teoria falsa,
isso não impede que alguém possa usá-la como ponto de partida para um filme,
como foi no medíocre thriller Sem
Limites, dirigido por Neil Burguer e estrelado por Bradley Cooper. Agora é
Luc Besson quem resolve montar uma história a partir disso neste Lucy, que coloca Scarlett Johansson no
centro de uma eficiente mistura de filme de ação com ficção científica.
Lucy se concentra na personagem-título (vivida por Johansson), uma
jovem estudante que é forçada pelo namorado a entregar uma maleta a um certo
Sr. Jang (Choi Min-sik, o eterno Oh Dae-su, de Oldboy). O que deveria ser uma tarefa simples se complica quando
Jang resolve usar Lucy como mula para transportar uma nova e potente droga chamada
CPH4, implantando-a na barriga da moça. Mas um de seus capangas a agride,
fazendo o pacote se romper e permitindo que a substância entre em contato com o
organismo dela. Como resultado, Lucy ganha habilidades inimagináveis graças ao
fato de a droga expandir suas atividades cerebrais, que aumentam à medida que o
tempo passa. Mas a jovem também fica em seus últimos momentos de vida, e ao
mesmo tempo em que precisa lidar com Jang e seus capangas, ela pede ajuda ao
Professor Samuel Norman (Morgan Freeman) para entender o que está acontecendo e
saber o que deve fazer com seus recém-adquiridos poderes.
O modo como Besson desenvolve sua
premissa não tem uma lógica bem estabelecida, iniciando quase como um filme de
super-herói e em outro momento se aproximando de Transcendence, a fraca ficção científica estrelada por Johnny Depp
recentemente. E devido a isso, chega a ser engraçado (mesmo que um tanto bobo)
que Lucy possa ler mentes usando cerca de 20% de sua capacidade cerebral ou
simplesmente não sinta dor, detalhe que rende uma cena divertidamente over em um hospital, quando ela vai
tirar o pacote com CPH4 de seu corpo. Mas aos poucos o diretor-roteirista
mostra que, na verdade, sua proposta é acompanhar Lucy perdendo gradativamente tudo
aquilo que a faz humana, com ela buscando então usar os poderes para repassar seus
conhecimentos e, de alguma forma, ajudar as pessoas a se tornarem seres
melhores do que são. Nisso, o filme usa sua protagonista para fazer quase que
um estudo da evolução humana, algo até surpreendente de se ver na história.
Iniciando como uma jovem
extremamente vulnerável e demonstrando grande segurança depois que ganha os
poderes, Lucy se revela uma protagonista forte e ideal para a história. Sendo
assim, boa parte da eficiência do filme se deve a Scarlett Johansson, atriz que
desde o ano passado vem escolhendo sabiamente os projetos para os quais dedica
seu talento. Johansson carrega a narrativa maravilhosamente bem, retratando as
mudanças de sua personagem admiravelmente ao interpreta-la praticamente como um
androide durante quase toda a projeção, o que é perfeito para a proposta do
filme.
No entanto, Lucy sofre com problemas de ritmo que enfraquecem o resultado final.
No início, por exemplo, Luc Besson se concentra na tensão que a protagonista enfrenta
com Jang, mas várias vezes ele resolve parar isso para dar espaço às
explicações de Samuel Norman sobre o funcionamento cerebral das pessoas, o que
é feito de maneira expositiva e aborrecida. Aliás, é uma pena que Morgan
Freeman apareça basicamente para dar essas explicações, não tendo muito mais o
que fazer ao longo da história. Além disso, não podemos esquecer que Besson
também busca fazer um filme de ação, incluindo algumas perseguições e tiroteios,
mas essas sequências não são muito interessantes, já que Lucy é poderosa
demais. Dessa forma, em nenhum momento pensamos que ela terá dificuldades para
se livrar dos vilões. E por mais curiosa que seja a presença de Choi Min-sik,
seu Jang nunca se mostra ameaçador.
Trazendo ainda um final que leva
a premissa a níveis impressionantes, apesar de absurdos, Lucy rende um entretenimento satisfatório. E considerando que Luc
Besson tem uma carreira com mais pontos baixos do que altos, não deixa de ser
uma surpresa que depois do divertido A
Família ele tenha até conseguido manter a consistência.
Nota:
2 comentários:
O cinema de Luc Besson é voltado para o entretimento descartável, bem diferente do início de carreira quando ficou conhecido pelo cult "Subway".
A teoria da utilização de apenas 10% do cérebro é ótima premissa.
Abraço
Eu não gostei muito desse filme, achei que ele se perdeu no final. Quando acabou fiquei olhando pra tela e me perguntado: "e?" será que foi só eu? Rs.
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