quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

No Coração do Mar

Em 1820, numa época em que o óleo de baleias era uma mercadoria valiosa, o navio Essex partiu com sua tripulação em uma longa jornada para encher o maior número possível de barris com o produto. O que os homens a bordo não imaginavam era que iriam bater de frente com uma cachalote que arrasou o navio e os deixou perdidos no mar durante meses, obrigando-os a cometer atos horríveis para manterem-se vivos. O evento veio a ser uma das principais influências do autor Herman Melville na concepção do clássico literário Moby Dick e foi o foco de No Coração do Mar, livro de Nathaniel Philbrick que agora ganha uma adaptação para o cinema pelas mãos de Ron Howard, rendendo uma produção eficiente ao retratar com propriedade a tensão e o desespero que aqueles homens enfrentaram.

No Coração do Mar começa em 1850, mostrando o próprio Herman Melville (Ben Whishaw) tentando falar com Thomas Nickerson (Brendan Gleeson), último membro vivo da tripulação do Essex e atormentado pelas memórias da tragédia que vivenciou. A partir dos relatos de Nickerson, vamos para 1820, quando ele era apenas um garoto (vivido por Tom Holland) em sua primeira experiência no mar, estando sob o comando do capitão George Pollard (Benjamin Walker) e do primeiro imediato Owen Chase (Chris Hemsworth), que iniciam uma grande rivalidade. Mas o que deveria ser uma jornada de trabalho tranquila vira um caos depois que o navio chega a uma região arriscada.

Ao longo do filme, Ron Howard se esforça para contar a história de forma que ela tenha o peso que merece, e é bom ver que esses esforços têm resultado na tela. O diretor não desvia o olhar de detalhes mais desconfortáveis da trama, seja nos obstáculos viscerais enfrentados pelos personagens ou no trabalho deles tirando o óleo das baleias, aspecto no qual é possível ver a boa dinâmica da tripulação do Essex e um curioso senso de humor (a cena em que o jovem Thomas Nickerson entra em uma baleia é exemplo perfeito disso). Além disso, Howard exibe segurança ao conduzir os embates envolvendo o cachalote, conseguindo impor tensão de maneira ágil, ainda que o fraco 3D prejudique um pouco as cenas.

Mas é nas consequências dos ataques do animal ao navio que No Coração do Mar encontra maiores forças. São detalhes que obviamente acabam sendo muito mais impactantes, e Ron Howard merece créditos por retratar eficientemente a desolação sentida pelos personagens, que se veem em uma situação que fica mais aterrorizante e vulnerável a cada dia que passa. No entanto, vale dizer que o fato de o roteiro dedicar boa parte do tempo para desenvolver aqueles indivíduos, de forma que sejam um pouco mais do que meros pedaços de carne unidimensionais, facilita a identificação do público com eles, ao passo que o bom elenco não só ajuda a torna-los interessantes como também encarna convincentemente seu desgaste gradual.

Trazendo um design de produção impecável e um ótimo trabalho de montagem, que intercala com naturalidade o passado de 1820 com o presente de 1850, No Coração do Mar é o segundo acerto seguido de Ron Howard (o outro sendo Rush), dando um bom respiro a sua filmografia. Ao explorar sem medo o fato de que a humanidade às vezes não é nada diante de outras espécies que habitam esse mundo (algo sintetizado em um diálogo entre Owen Chase e George Pollard), Howard faz uma obra admirável e que não se segura exclusivamente em sua escala espetacular para manter o público envolvido em sua história marcante.

Nota:


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