“Deus não nos concebeu para jogar
futebol”, afirma o patologista forense Bennet Omalu (Will Smith) em determinado
momento deste Um Homem Entre Gigantes.
Considerando que o filme foca a descoberta de Omalu sobre as consequências
letais das concussões sofridas por jogadores de futebol americano ao longo de
suas carreiras, algo que ele persistentemente buscou comprovar, é claro que afirmações
como a que abre este texto não são muito interessantes para os envolvidos no
esporte mais popular dos Estados Unidos, em especial os cabeças da poderosa NFL
(a Liga Nacional de Futebol). É a partir desse choque de interesses que o longa
de Peter Landesman se constrói, mas é uma pena que o filme em si não se mostre
tão intrigante.
Escrito pelo próprio Peter Landsman
a partir do artigo de Jeanne Marie Laskas publicado em 2009 na revista GQ, o
filme tem início em 2002, quando o jogador aposentado Mike Webster (David
Morse) é encontrado morto após se isolar do restante do mundo e virar um
sem-teto, tudo devido à demência. Omalu, um imigrante nigeriano extremamente
qualificado em sua área de trabalho, é chamado para examinar o corpo, concluindo
que o problema de Webster veio de sérios danos no cérebro, resultantes das frequentes
pancadas na cabeça que o ex-jogador recebeu nos vários jogos que participou.
Chamada de Encefalopatia Traumática Crônica, a doença pode atingir qualquer jogador.
Mas, ao tentar comprovar suas descobertas, Omalu bate de frente com a NFL, que passa
a tentar desacreditá-lo, não querendo correr riscos de ver prejudicado o
esporte que rende bilhões de dólares.
É uma história clássica de David
e Golias, sendo que o longa até lembra um pouco o recente e excepcional Spotlight, no sentido de trazer pessoas
comuns enfrentando uma grande corporação, que até chega a justificar sua
negligência através das coisas boas que realiza (assim como a Igreja Católica naquele
filme). No entanto, as semelhanças entre as duas produções param por aí, já que
Um Homem Entre Gigantes se estrutura
de um jeito pouco interessante ao contar sua história. Por um lado, Peter
Landesman tenta fazer um drama que siga os passos de obras brilhantes como O Informante (clássico de Michael
Mann), mas a execução não deixa de ser um tanto burocrática na forma como aborda
a investigação científica de Omalu e as consequências de encarar uma instituição
do nível da NFL. Por outro, o roteiro desenvolve o romance entre o protagonista e Prema
Mutiso (Gugu Mbatha-Raw), mas essa parte da trama, cuja grande função parece
ser humanizar Omalu para o público, não só se desenrola de maneira óbvia como
ainda desvia o foco daquilo que o filme realmente quer contar.
Sendo assim, Landesman encontra
dificuldades para criar uma narrativa instigante, algo que se complica também
por ele não conseguir desviar dos graves problemas de ritmo que assolam o filme
durante a história. Não é à toa que em determinados momentos ele parece mais
longo do que realmente é. Além disso, o diretor falha em seus esforços de dar
peso ao que está acontecendo, como quando Omalu e Prema recebem uma notícia trágica,
em uma cena que carece de qualquer impacto, revelando um pouco a falta de
sensibilidade com a qual é conduzido o lado mais humano da narrativa.
Interpretando Bennet Omalu como um
homem cheio de maneirismos e cujas excentricidades são vistas com
distanciamento por algumas pessoas (sua mania de falar com os mortos é exemplo
disso), Will Smith exibe um sotaque nigeriano convincente e o carisma que
marcou a maior parte de sua carreira. Mas ainda assim, este não é um trabalho
particularmente digno de prêmios como chegou a ser considerado. Já Gugu
Mbatha-Raw faz o possível no papel de Prema, ao passo que Alec Baldwin e Albert Brooks
trazem credibilidade a Julian Bailes, médico que trabalhava para a
NFL e que busca uma espécie de redenção, e Cyril Wecht, o chefe de Omalu.
Um Homem Entre Gigantes poderia ser um filme melhor considerando os
eventos que retrata. As informações vistas aqui são obviamente importantes,
servindo de exemplo sobre como grandes corporações se preocupam mais com os
próprios interesses do que com fazer o certo pelas pessoas. Mas isso
infelizmente não chega a ser o suficiente para sustentar o filme.
Nota:
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