sexta-feira, 7 de março de 2014

Seven: Os Sete Crimes Capitais

David Fincher estreou como diretor de longas-metragens com o terceiro episódio da série Alien, que se revelou uma grande decepção – principalmente se considerarmos o alto nível dos capítulos anteriores. O diretor diria posteriormente que não teve uma boa experiência neste projeto inicial, com os produtores controlando-o o tempo todo. No entanto, em seu trabalho seguinte, o realizador conseguiu mostrar toda sua competência por trás das câmeras, deixando claro o excepcional cineasta que realmente é. O filme em questão foi Seven: Os Sete Crimes Capitais, uma das grandes obras-primas da década de 1990.

Escrito com uma meticulosidade incrível por Andrew Kevin Walker (que infelizmente não manteve o mesmo brilhantismo em suas produções seguintes), Seven nos apresenta ao detetive William Somerset (Morgan Freeman), que está prestes a se aposentar quando passa a cuidar do caso de um serial killer que usa os sete pecados capitais como base para seus crimes. Com a ajuda do novato David Mills (Brad Pitt), Somerset vai aos poucos se aprofundando no caso, que fica cada vez mais assustador à medida que os assassinatos vão ocorrendo, sendo diferente de qualquer coisa que o experiente detetive tenha visto até então.
Logo no início é possível prever que Seven não será um filme fácil. Em uma de suas primeiras cenas, por exemplo, Somerset é obrigado a usar um metrônomo para que os sons da violência que ocorre do lado de fora de sua casa sejam abafados e ele possa dormir, o que mostra o quão estressante é seu trabalho. Isso é seguido pelos ótimos créditos iniciais, que já tratam de estabelecer um tom sombrio que percorrerá toda a trama. É impossível não admirar a atmosfera claustrofóbica imposta por Fincher com a ajuda da excelente fotografia de Darius Khondji e da ótima trilha de Howard Shore, que ainda criam um belo clima de suspense para a história. Enquanto isso, a montagem ágil de Richard Francis-Bruce (que foi merecidamente indicado ao Oscar na época), somada ao nível de tensão de certas cenas, faz com que o espectador fique sempre inquieto. Apesar da história se passar durante uma semana, com um assassinato ocorrendo a cada dia, Francis-Bruce merece créditos ainda por trazer grande fluidez à narrativa, nunca deixando o filme ficar episódico.
Outro ponto admirável em Seven é que o roteiro de Andrew Kevin Walker, mesmo se preocupando com a investigação, que serve como base para a trama, dá maior atenção ao desenvolvimento de seus personagens, em uma decisão arriscada, mas que torna o filme muito mais instigante. É interessante notar como Somerset e Mills são praticamente os opostos um do outro, o que vai desde suas personalidades até o modo como levam suas vidas. Enquanto o primeiro é mais racional, culto e solitário (detalhes que são frutos de sua própria experiência como detetive), o segundo é impulsivo, emotivo, um tanto ingênuo e parte de um casamento feliz com Tracy (Gwyneth Paltrow). Mas, mesmo sendo diferentes, ambos os detetives são eficientes naquilo que fazem e se mostram determinados a resolver o caso que têm em mãos.
Além disso, Morgan Freeman e Brad Pitt têm algumas de suas melhores atuações interpretando os protagonistas, compondo-os com cuidado e desenvolvendo uma química impecável em cena. Esta mesma boa sintonia eles compartilham com Gwyneth Paltrow, que em seu pouco tempo de tela é hábil ao fazer de Tracy uma figura simpática, afetuosa, vulnerável e não menos interessante do que os outros personagens, algo que acaba sendo essencial no terceiro ato. No entanto, quem se sobressai no elenco é o excepcional ator que encarna John Doe, o responsável pelos crimes hediondos que vemos na tela (prefiro não revelar a identidade do intérprete, mesmo que o filme tenha quase 20 anos e todos já devem saber quem se trata). Quando John Doe surge em cena, nos deparamos com um ser frio e calmo, características que vão contra a imagem que construímos dele durante o filme, mas que o tornam muito mais ameaçador do que imaginávamos. E o curioso com relação a ele é que ainda que seus crimes sejam violentos, eles nunca aparecem sendo cometidos, com David Fincher nos deixando ver apenas os resultados, suficiente para evidenciar a psicopatia do personagem (o que dizer das vítimas da Gula e da Preguiça?).
O que nos traz ao magnífico terceiro ato de Seven, que é o ápice de tudo o que foi visto até aquele momento. Situada em um lugar isolado e desértico do qual é difícil escapar, essa sequência é conduzida com maestria pelo diretor, com uma tensão crescente e uma reviravolta absolutamente arrasadora que prova a inteligência do sádico vilão. E o fato de que, no decorrer da história, o roteiro apresente momentos nos quais os personagens poderiam ter evitado tal desfecho faz com que o final seja ironicamente trágico (logo no início, por exemplo, Somerset tenta largar o caso, o que ele com certeza gostaria ter feito se soubesse como terminaria). Sem dúvida é uma conclusão inesquecível, que faz o público ficar com os nervos à flor da pele e mostra a coragem do roteirista ao oferecer um rumo amargo, mas perfeito para sua história, evitando qualquer clichê.
Seven é um thriller policial que certamente entra no grupo dos melhores do gênero, mostrando boa parte da crueldade que domina o mundo em que vivemos. E, por isso, chega a ser difícil não concordar com a frase proferida por um dos personagens no final: “Ernest Hemingway escreveu uma vez ‘O mundo é um lugar bom, e vale a pena lutar por ele’. Eu concordo com a segunda parte”.
Nota:

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