sábado, 24 de março de 2012

Jogos Vorazes

Quando os filmes de Harry Potter estavam chegando ao fim, os estúdios começaram a tentar encontrar uma espécie de substituto. Percy Jackson e o Ladrão de Raios e a "saga" Crepúsculo receberam essa tarefa, mas resultaram apenas em sucessos financeiros, já que são fracos como filmes. Eis que mais uma nova história chega aos cinemas com o mesmo objetivo de tentar preencher a lacuna deixada pelo bruxo e seus amigos. Mas diferente dos outros candidatos, Jogos Vorazes parece ter um universo e uma protagonista interessantes para render uma franquia satisfatória.
Escrito pelo diretor Gary Ross em parceria com Billy Ray e Suzanne Collins, baseado no livro desta última (que não li ainda), Jogos Vorazes se passa no futuro, em um país chamado Panem, que é dividido em 12 distritos e a controladora Capital. Todo ano, um casal de jovens de cada distrito é selecionado para participar dos violentos Jogos Vorazes, evento no qual os competidores lutam até a morte e apenas um pode sair vencedor. Quando sua irmã mais nova é chamada para participar, Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) se oferece para ir no lugar dela, formando ao lado de Peeta Mellark (Josh Hutcherson) o casal do Distrito 12.
Logo no início, Gary Ross mostra muito bem a precariedade do Distrito 12, um local onde um mero pãozinho pode ser motivo de comemoração e uma fala de Katniss para seu gato (“Ainda vou te cozinhar”) não surge como uma piada engraçada. Vendo esse mundo triste, a conversa entre ela e o amigo Gale (Liam Hemsworth) sobre não querer ter filhos é bastante compreensível. A boa fotografia de Tom Stern e os figurinos investem muito em cores acinzentadas, tirando com sucesso qualquer sinal de felicidade do lugar. Isso cria um ótimo contraste com o que vemos na Capital, lugar repleto de cores quentes e pessoas ricas e sorridentes.
Ross utiliza a câmera na mão durante quase todo o filme, o que trás pontos positivos e negativos. Por um lado, o diretor consegue deixar as cenas de ação tensas, e como tudo acontece muito rapidamente, a confusão e o nervosismo de Katniss são muito bem retratados pelo tremer da câmera e pela redução no som. Por outro, Ross acaba deixando algumas lutas e ações incompreensíveis, como a corrida de um personagem pela floresta. Apesar disso, Ross consegue mostrar o quanto os Jogos Vorazes são violentos (tive a leve impressão de ter visto uma perna ser decepada), o que faz nós temermos pelo destino da protagonista e de Peeta.
O roteiro estabelece os Jogos Vorazes como algo imprevisível, já que os tributos (como são chamados os selecionados para participar) podem morrer de diversas formas, sejam assassinados ou por causas naturais. O torneio é o entretenimento do povo da Capital, que se diverte vendo as apresentações dos competidores em programas de televisão e ainda apostam em quem vai chegar vivo no final. Por colocarem jovens inocentes em situações tão perigosas, os organizadores do evento tornam-se figuras desprezíveis, e isso faz com que torçamos ainda mais para que Katniss, Peeta e outros personagens, como Rue (Amandla Stenberg, que tem uma participação marcante, apesar do pouco tempo em cena), sobrevivam. As consequências que os Jogos Vorazes podem trazer ao seu campeão podem ser vistas no mentor de Katniss e Peeta, Haymitch (o excelente Woody Harrelson), que me arrisco a dizer que se tornou alcoólatra após ter sido obrigado a fazer coisas que não queria com o objetivo de sobreviver.
A afeição que criamos pelos os personagens ao longo da história é o que segura Jogos Vorazes até o final. E isso se deve não só ao roteiro, que os desenvolve muito bem, mas também ao elenco. Desde que foi indicada ao Oscar pelo excelente Inverno da Alma Jennifer Lawrence vem mostrando ser uma atriz que merece atenção, tendo neste filme uma presença em cena absolutamente incrível. Katniss é uma garota de personalidade forte e que não se intimida diante de grandes desafios. Corajosa e independente, ela não se importa apenas com a sua própria sobrevivência, o que é bastante admirável em um torneio bárbaro pelo qual alguns competidores treinam a vida inteira para entrar e matar qualquer um sem piedade.
Enquanto isso, Josh Hutcherson tem em Peeta um personagem parecido com Katniss, mas aparentemente mais fraco, o ele mesmo admite em determinada cena. Algo interessante nele é o fato de não se importar se vai morrer (uma ideia que eles se veem obrigados a se acostumar), desde que sua personalidade não seja mudada pelas circunstâncias. Isso o faz ser digno da confiança do público mesmo quando está ao lado dos competidores “vilões”.
No entanto, é uma pena que o roteiro perca tempo explicando elementos desnecessários, como o que acontece após ser picado por um determinado inseto, e não explique outras coisas mais importantes, como o sinal que Katniss e outros membros do Distrito 12 fazem. Além disso, a resposta para o porquê de os Jogos Vorazes terem sido criados soa um pouco rasa, embora surja na tela de forma bastante natural. E a atenção que Gary Ross concede a uma competidora do Distrito 5 é incompreensível, criando expectativas em volta de algo que não resulta em nada.
A julgar por este primeiro filme, Jogos Vorazes surge como uma franquia promissora. Ao final da projeção, fica a curiosidade sobre qual será o caminho que os próximos capítulos seguirão. Talvez estejamos vendo o início de uma saga interessante. Repito, talvez.
Cotação:

Um comentário:

Yuri Célico disse...

Então, boa crítica Thomás, creio que não escreverei muito diferente do que você ao falar do filme.

Concordo plenamente, a câmera na mão tem seus propósitos, como amenizar a violência vista em cena ao torna-la incompreensível, o que por um lado funciona na hora de receber a classificação indicativa, por outro prejudica os mais grandinhos como nós que sabemos disso e nos irritamos tentando descobrir quem é que ta batendo em quem naquelas lutas.

E já que você citou algumas perdas de tempo no filme eu tenho que falar daquela cena da árvore em que ela fica encurralada. A própria ideia de ela subir lá é idiotice, mas o fato de eles simplesmente terem um arco e flecha, fogo e uma atiradora de facas no grupo dos vilões torna inaceitável a ideia de que nenhum desses podia ter feito alguma coisa pra ela descer de lá.

Mas mesmo com alguns percalços o filme me ganhou a curiosidade e embarquei na trama, tua crítica diz isso muito bem.

Abraços Thomás!!