sábado, 21 de julho de 2012

Valente

Ano passado, quando lançou Carros 2, a Pixar conseguiu fazer seu primeiro filme realmente decepcionante. Mais cedo ou mais tarde isso iria acontecer, afinal até os gênios falham em algum ponto de suas vidas. Com isso em mente, seria difícil que o estúdio fizesse logo em seguida um filme de qualidade igual ou pior que a da continuação das histórias de Relâmpago McQueen e Mate. Sendo o primeiro filme original da Pixar desde Up: Altas Aventuras, Valente não chega a ser um grande retorno do estúdio de John Lasseter à boa forma que exibia, por exemplo, na trilogia Toy Story, sendo um filme que se salva em grande parte graças a sua protagonista.
Escrito pelos diretores Mark Andrews, Brenda Chapman e Steve Purcell ao lado de Irene Mecchi, e baseado no argumento de Chapman, Valente nos apresenta a Merida (voz na versão original de Kelly Mcdonald), a jovem princesa do reino de Dunbrock. Sua mãe, a Rainha Elinor (Emma Thompson), faz de tudo para transformá-la em uma dama, enquanto que seu pai, o Rei Fergus (Billy Connolly), não vê muito problema na garota saber se defender um pouco. Ao se recusar a seguir as tradições da família e não deixar que sua mão seja competida pelos príncipes dos três reinos vizinhos, Merida entra em conflito com Elinor e com a ajuda de uma bruxa (Julie Walters) arranja um feitiço para fazer sua mãe mudar de ideia quanto ao que está acontecendo. Mas o plano não sai como desejado e a jovem acaba transformando Elinor em um urso.
Filmes de princesa sempre foram uma área da Disney, então é um pouco surpreendente ver a Pixar mexendo com esse tema. Mas Valente tem em Merida mais uma grande personagem para a coleção do estúdio. Ela é a verdadeira razão de ser do filme, que poderia fracassar por completo caso contasse com uma protagonista menos interessante. Merida conquista por ser uma figura independente e com grande força de vontade para lutar por aquilo que acha certo, além de não ser uma típica donzela em perigo. Não deixa de ser interessante o detalhe de sua arma predileta ser o arco e flecha, já que seu pai diz em certo momento que “flechas apontam o caminho”. Quando usa a arma, Merida acerta o alvo que quiser, o que é um reflexo daquilo que ela mais deseja: ser livre para seguir o caminho que quer.
Sempre que foca outra coisa que não seja sua protagonista, Valente perde muito de sua força, e o roteiro tenta compensar isso com o riso. As várias gags que aparecem ao longo da história são constantes, como se fossem uma atração à parte no filme, e isso não acontecia muito nas animações da Pixar, que sempre se concentrava mais em seus personagens e na história do em que tentar fazer rir disparando piadas para todos os lados. Sendo um humor físico, o roteiro investe muito dessas gags na rainha se atrapalhando diante da situação de ser um urso, além de colocar outros personagens da realeza se atrapalhando também. É engraçado, mas depois de um tempo fica um pouco repetitivo. As piadas também se concentram bastante nos três irmãos caçulas da garota, que cumprem satisfatoriamente seu único propósito: o de alívio cômico. Se não fosse por isso, os pestinhas seriam completamente descartáveis.
O roteiro ainda demonstra um pouco de falta de imaginação ao utilizar o velho clichê do limite de tempo que, se ultrapassado, transformará a situação em algo permanente (Shrek 2 é o primeiro filme que me veio a cabeça nesse momento). Isso deixa o filme até um pouco previsível, além de surgir como algo realmente necessário apenas no final, quando o tempo está quase acabando. Até então, a tensão era imposta muito mais pela urgência de Merida em tentar fazer sua mãe voltar ao que era antes. Além disso, é lamentável que o filme apresente personagens interessantes, como a bruxa e o Rei Fergus, e não dê muita atenção a eles, sendo que a primeira é descartada pouco depois de aparecer.
Logo no início, ao mostrar a infância da protagonista, o roteiro estabelece a relação entre Merida e Elinor de forma bastante amorosa, ainda que a rainha coloque algumas restrições na filha (ela só está livre de suas lições de princesa em um dia da semana, por exemplo). Mesmo assim, a relação entre mãe e filha consegue ser um dos pontos altos de Valente. O modo encontrado para que as duas personagens tentem se entender é um tanto exagerado, mas Valente consegue belos momentos quando se concentra em Merida e Elinor se reaproximando, como em uma cena em que elas comem peixe na cachoeira.
O trio de diretores dá atenção a certos detalhes que ajudam a animação a ser bonita e realista, como quando os cabelos de Merida se movem por causa do vento ou a maneira como uma flecha treme após ser disparada. Eles ainda conseguem mudar o tom do filme de maneira rápida e natural em determinadas cenas. Se em um segundo temos um ambiente tranquilo, no seguinte o perigo pode tomar conta. Isso ocorre sempre que aparece o urso Mordu, o vilão da história (se é que ele pode ser classificado dessa forma, já que ele sempre age por instinto e não por ter algo contra os personagens). Com seus pelos desgrenhados e dentes afiados, Mordu consegue ser ameaçador em todas as cenas em que aparece, nos fazendo temer pelo destino dos personagens.
Por ser melhor que Carros 2 o filme já merece créditos, mas Valente consegue ser um entretenimento agradável, ainda que esteja longe de ser uma das melhores obras da Pixar. Esperemos que o estúdio volte ano que vem com um filme que relembre seus excelentes tempos.
Obs.: O curta-metragem La Luna, que passou antes do filme, é bem interessante.
Cotação:

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