sábado, 21 de janeiro de 2012

2 Coelhos

Já está sendo algo comum o cinema brasileiro pegar algumas coisas de Hollywood. Podemos perceber isso em muitos filmes, desde os dois fracos Se Eu Fosse Você até o ótimo O Homem do Futuro, passando pelo pavoroso Assalto ao Banco Central e a vergonha alheia Segurança Nacional. A influência do cinema americano nesses filmes é bastante óbvia, e geralmente resulta em má qualidade. O que nos faz chegar a 2 Coelhos, mais uma exceção a regra. É uma produção que bebe da fonte hollywoodiana de fazer filmes, mas não é apenas um mero exercício de estilo, tendo também o propósito de montar uma narrativa envolvente e interessante.
Escrito e dirigido pelo estreante Afonso Poyart, 2 Coelhos nos apresenta a Edgar (Fernando Alves Pinto), jovem inteligente com um grande plano para tirar dois milhões de dólares do grupo liderado por Maicon (Marat Descartes). A armação de Edgar envolve ainda o deputado corrupto Jader (Roberto Marchese), a promotora de justiça Julia (Alessandra Negrini), o ex-professor Walter (Caco Ciocler) e a dupla de ladrões Velinha (Thaíde) e Clayton (Robson Nunes). Ao longo do filme, as histórias dos personagens vão revelando estar mais interligadas do que aparentam e o plano cada vez mais mirabolante.
Adotando uma estrutura narrativa que segue várias histórias a fim de nos mostrar todos os envolvidos no plano de Edgar, o roteiro de Poyart mostra ser um desafio para a montagem, realizada por ele, André Toledo e Lucas Gonzaga. O diretor-roteirista desenvolve sua história, mas sempre que chega a um ponto importante, ele interrompe a ação e nos mostra como os personagens chegaram até ali (algo que Guy Ritchie fez em seus filmes de Sherlock Holmes), usando ainda a narração em off de Edgar, que às vezes aparece explicativa demais. É uma opção que deixa o filme mais curioso de se assistir, e, portanto, mais envolvente.
Algo que não falta em 2 Coelhos são tipos de linguagem. Afonso Poyart usa diversos formatos para contar sua história, desde animações até o estilo mockumentary (que, aliás, traz depoimentos sobre o protagonista que formam uma rima divertida entre o início e o fim do filme). Cada um desses tipos de linguagem aparece no filme naturalmente e fazem de 2 Coelhos uma experiência fascinante do ponto de vista estético. Por exemplo, nos ataques de pânico de Julia, o diretor usa desenhos de pequenos animais para mostrar a imaginação da personagem ao tentar se acalmar. Quando ela não consegue, eles a atacam como monstros, e o modo como um remédio faz resultado nessa imaginação é sensacional. Estas sequências “imaginativas” fazem lembrar muito 300 e Sucker Punch, ambos de Zack Snyder, até pela fotografia empregada por Carlos Zalasik.
Aliás, Snyder parece ter servido de grande inspiração para Afonso Poyart. É difícil não lembrar desse diretor nas cenas em câmera lenta. Mas é bom ver que Poyart só utiliza este efeito para fazer a ação do filme ter um impacto maior do que teria normalmente. Outro elemento que torna 2 Coelhos uma obra interessante é o fato de o diretor fazer rabiscos em alguns momentos do filme, como pequenos desenhos em cima do protagonista, revelando um pouco da personalidade dele e como leva sua vida.
Poyart ainda cria sequências de ação empolgantes. Logo no início, ele mostra um sensor de proximidade que, além de mostrar a inteligência do protagonista, ainda acaba tendo papel importante em uma perseguição de carros. E as cenas de tiroteio também são muito eficientes, destaque para a que acontece no apartamento de Maicon, um dos vários usos impactantes da câmera lenta.
O uso da canção “Kings and Queens”, da banda 30 Seconds to Mars, também mostra ter um propósito interessante. Apesar de ter um ritmo que não combina muito com o filme, enjoando ao ser tocada quatro vezes em diferentes pontos da história, a canção serve para ressaltar a felicidade que os personagens sentem em certos momentos. Além disso, ela conecta muito bem as histórias de Edgar e Walter, que é marcada por uma tragédia. Uma pena, no entanto, que o roteiro não desenvolva muito bem o relacionamento entre os dois personagens. Edgar diz em certo momento que a vida de Walter pode ser definida como AE e DE (antes de Edgar e depois de Edgar). Nós vemos como a relação deles começou, mas o que acontece mais adiante não é mostrado, o que não deixa muito claro como as coisas aconteceram para que os dois se encontrem na situação do terceiro ato do filme.
O elenco de 2 Coelhos também merece destaque. Fernando Alves Pinto traz grande carisma para Edgar, enquanto que Alessandra Negrini sempre muito forte interpretando Julia. Enquanto isso, Marat Descartes faz de Maicon um vilão simpático no início (algo ressaltado até mesmo por Edgar, em uma sequência que lembra os primeiros filmes da história do cinema), mas que revela sua maldade ao longo do filme. E se Thaíde e Robson Nunes demonstram uma boa química como a dupla Velinha e Clayton, Caco Ciocler tem em Walter um personagem que fala em poucas cenas, mas que é marcante por ter uma participação maior do que pensamos no plano de Edgar.
O cinema brasileiro começou mal o ano com As Aventuras de Agamenon: O Repórter (filme que não assisti ainda, mas que só escuto comentários de que é o pior do ano). Mas aos poucos, acredito que seremos recompensados com um cinema de qualidade. 2 Coelhos é o primeiro da lista. Que venham os próximos.
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