Em se tratando de filmes de
terror e suspense, o diretor Mike Flanagan é um dos nomes que têm chamado minha
atenção recentemente, tendo comandado os ótimos Absentia, O Espelho e Hush, este último tendo sido distribuído
há poucos meses pela Netflix. Provando estar bastante ativo, o diretor lança agora
O Sono da Morte, o segundo de três
filmes que programou para esse ano e que se mostra eficiente ainda que inferior a seus
trabalhos anteriores.
Escrito pelo próprio diretor em
parceria com Jeff Howard, O Sono da
Morte parte de uma premissa semelhante ao que já vimos em várias outras
produções. Um casal, Jessie e Mark (Kate Bosworth e Thomas Jane, respectivamente),
acaba de perder o filho em um acidente e, para tentar superar o sofrimento e a
tristeza decorrentes disso, decidem adotar uma criança que revela não ser uma
figura comum. No caso, o pequeno Cody (interpretado por Jacob Tremblay) constantemente
evita cair no sono, já que ele tem o dom de fazer com que seus sonhos interajam
com a vida real enquanto está dormindo. Inicialmente, Jessie e Mark ficam admirados
quanto às possibilidades do poder, mas logo entram em pânico ao verem que os terríveis
pesadelos do garoto também ganham vida.
Nunca é explicado como Cody é
capaz de fazer essas coisas, mas trata-se de um conceito interessante e que o
roteiro utiliza tendo noção do perigo que há por trás dele, algo que vale não
só para os pesadelos do garoto, mas também para as tentativas de Mark e Jessie
de usar o poder para preencher o vazio que sentem quanto à perda que sofreram, abrindo
as portas para várias ilusões. No entanto, há de se ressaltar que o filme não
deixa de apresentar um desenrolar um tanto conveniente e pouco orgânico nesse
sentido, com o poder de Cody sendo usado de acordo com as necessidades do
roteiro, o que podemos ver quando o garoto sonha com eventos específicos que
lhe foram apresentadas minutos antes.
Isso, porém, não impede Mike
Flanagan de mostrar sensibilidade ao tratar os dramas pessoais de seus
personagens, humanizando-os para que o público se importe com eles, além de
mais uma vez exibir talento para criar momentos de tensão, e nesse sentido a
cena em que Jessie e Mark não conseguem acordar Cody e precisam lidar com o
monstro que aparece nos pesadelos dele é um ponto particularmente bom do filme.
Já a fotografia de Michael Fimognari merece créditos por modular bem entre cores
quentes, que ajudam a indicar o conforto e a tranquilidade da casa dos
personagens e dos sonhos de Cody, e tons mais escuros, que tomam a tela sempre
que os pesadelos aparecem.
Enquanto isso, Kate Bosworth
interpreta Jessie com uma inexpressividade que poderia torna-la aborrecida, mas
por sorte é um aspecto que combina com o que a personagem sente, deixando claro
que a falta do filho é difícil de suprir, algo que ela encara sem permitir que
sua ternura como mãe se apague. Aliás, ela compartilha isso com Mark, que
Thomas Jane encarna como um homem que busca esconder o sofrimento em meio a seus
esforços para que as coisas melhorem (uma pena que uma cena importante
envolvendo o personagem não tenha muito impacto). Mas o filme acaba sendo mesmo
de Jacob Tremblay, que depois de surpreender no excelente O Quarto de Jack (por sinal, uma atuação que deveria ter sido mais
premiada) aqui volta a mostrar uma doçura encantadora como Cody, um menino que
poderia ser vilanizado, mas que aqui se estabelece como alguém vulnerável e que
tem medo de seu próprio dom, não só por não querer fazer mal as pessoas a sua
volta, mas também por desconhecer a extensão do que pode fazer.
O Sono da Morte escorrega um pouco no terceiro ato, que se por um
lado traz uma origem tocante para o tal monstro que assombra os pesadelos de Cody,
por outro tenta forçar alguns finais felizes que soam pouco convincentes, sem
falar que ao longo do filme o roteiro perde tempo com elementos nada
interessantes, como a subtrama envolvendo um colega mal-encarado de Cody. Mesmo
assim, Mike Flanagan concebe uma obra que consegue explorar bem seus
personagens em questões dramáticas, não se contentando só com a tensão que
busca criar.
Nota:
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