Os filmes de Darren Aronofsky não
são exatamente conhecidos como experiências agradáveis para o espectador. O
diretor, na verdade, criou um hábito de nos apresentar a personagens e, a
partir daí, nos conduzir pela jornada de autodestruição deles, como em Pi,
Réquiem Para um Sonho, O Lutador e Cisne Negro. São obras
de grande densidade dramática e capazes de nos deixar angustiados por sabermos
o que determinados passos representam na vida daqueles indivíduos. Este novo
trabalho de Aronofsky, A Baleia, acaba sendo mais um exemplo desse seu hábito,
além de colocar Brendan Fraser de volta aos holofotes após um bom tempo.
Escrito por Samuel D. Hunter a
partir de sua própria peça de teatro, A Baleia nos apresenta a Charlie (Fraser),
um professor universitário que perdeu o namorado há algum tempo e agora vive
sob os cuidados da amiga enfermeira Liz (Hong Chau). Tais cuidados são
necessários porque Charlie sofre com obesidade mórbida, vivendo em reclusão em
seu pequeno apartamento. É então que ele resolve tentar se reconectar com sua
filha adolescente, Ellie (Sadie Sink), procurando resolver antigas mágoas.
Desde o princípio as origens
teatrais do texto de Samuel D. Hunter podem ser notadas, seja por diálogos
expositivos que estabelecem detalhes do passado dos personagens ou pelo fato de
o filme se situar quase todo em um único cenário (o apartamento de Charlie). Mas
este ponto não chega a limitar a narrativa, com Darren Aronofsky e seu habitual
diretor de fotografia Matthew Libatique optando por conceber o filme na tela com
uma razão de aspecto de 1.33:1 (o clássico quadrado 4:3), que contribui para tornar
opressivo o universo do protagonista, algo realçado também pela iluminação mais
escura que toma seu apartamento.
Esse visual faz com que A Baleia, por vezes, pareça um filme de terror, o que não deixa de ser apropriado se pensarmos que Charlie sofre de uma espécie de maldição. Mas se engana quem acha que a maldição a qual me refiro é o estado físico e clínico do personagem, já que sua obesidade e compulsão alimentar parecem ser os resultados desta maldição. O problema de Charlie, na verdade, é pensar muito dos outros e muito pouco de si próprio. Temos aqui um personagem que não consegue evitar de pensar o melhor das pessoas, acreditando constantemente que a humanidade tem potencial para coisas maravilhosas. Não é à toa que logo nos primeiros minutos vemos ele dando uma aula (via videochamada) em que procura ajudar seus alunos a se expressarem melhor naquilo que escrevem, idealizando que eles são melhores do que imaginam. Mas ele não inclui a si próprio nessa visão de mundo. “Quem iria me querer como parte de sua vida?”, diz ele em determinado momento. E mais uma vez, não é à toa que sua câmera se mantém desligada durante suas aulas. Ao lidar com esses elementos, o roteiro naturalmente cria um embate de ideias que encontra grande peso dramático no protagonista e ressoa nos outros personagens, principalmente Liz e o jovem missionário Thomas (Ty Simpkins).
Mas boa parte do porquê de A Baleia envolver o espectador e fazê-lo se importar com seu protagonista tem nome e sobrenome: Brendan Fraser. Ator que passou anos relegado a projetos duvidosos até ter a carreira revitalizada recentemente, Fraser tem aqui uma oportunidade ímpar de brilhar e não decepciona. Por trás do excelente trabalho de maquiagem necessário para compor Charlie, o ator cria um personagem quebrado por arrependimentos e por um luto constante, que se entrega a compulsão alimentar como se acreditasse que esta é a punição que merece, seja pelo que já viveu e sofreu ou por quem é. Trata-se de um homem que está longe de ser perfeito, mas que tem também muito da honestidade que procura ver nas pessoas, e Fraser preenche com humanidade cada fala e movimento do personagem, tendo ainda uma ótima dinâmica com a sempre excelente Hong Chau, que faz de Liz uma figura que há muito já deixou de tentar evitar que o amigo se destrua, cuidando dele dentro do que pode e lhe servindo como única base de afeto. E enquanto Sadie Sink e Ty Simpkins são eficazes nos papeis de Ellie e Thomas, Samantha Morton se destaca mesmo com poucos minutos em cena, exibindo uma bela sensibilidade como Mary, a ex-esposa de Charlie.
A Baleia pode ser uma
experiência triste e por vezes angustiante, mas se isso ocorre é porque Darren
Aronofsky realiza aqui uma obra que transpira empatia por seu protagonista e pelas
figuras ao redor dele, o que é algo bastante recompensador de ver.
Nota:
Um comentário:
Ah fiquei com vontade de ver esse filme!! Mas ao mesmo tempo não quero ficar triste hahahaha
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