Apesar de muitas vezes criarmos expectativas, a verdade é que é difícil saber o que esperar de uma obra de arte antes de conferi-la, principalmente se pensarmos que quase todo artista tem altos e baixos na carreira. Com um diretor como M. Night Shyamalan, essa incógnita talvez surja com mais força a cada obra que ele lança. Afinal, o que veremos será algo do calibre de O Sexto Sentido e Corpo Fechado (seus dois grandes filmes) ou outra bomba como Fim dos Tempos, Depois da Terra, Fragmentado, Tempo e outros?
Baseado no livro de Paul
Tremblay, este Batem à Porta acompanha a família formada pelo casal Eric
(Jonathan Groff) e Andrew (Ben Aldridge) e sua pequena Wen (Kristen Cui,
adorável), que estão de férias em uma cabana. É quando eles são abordados por
quatro indivíduos que pretendem invadir o local de qualquer forma e
confrontá-los. Eles são Leonard (Dave Bautista), Sabrina (Nikki Amuka-Bird),
Adriane (Abby Quinn) e Redmond (Rupert Grint), pessoas aparentemente comuns,
mas que estão ali para fazer o possível para que aquela família sacrifique um
de seus membros e, segundo eles, salve o resto da humanidade do apocalipse.
Por puro acaso, no dia anterior à
sessão de Batem à Porta, eu conferi O Sacrifício do Cervo Sagrado,
do sempre excelente Yorgos Lanthimos. E acaba sendo praticamente impossível não
fazer uma comparação entre as duas produções, considerando que ambas contam
histórias que colocam seres humanos recebendo a tarefa de sacrificar um ente
querido em prol de algo maior. Mas se Lanthimos montava uma narrativa
inquietante a partir da frieza dos personagens e de um contexto mais intimista
para falar da natureza humana, Shyamalan constrói Batem à Porta lidando
com ideias bíblicas que nos levam a discussões diferentes, onde algo mais amplo
parece estar em jogo.
É uma pena, porém, que tais discussões não fujam muito do óbvio. Estariam Leonard e companhia acreditando em algo verdadeiro? Ou são apenas malucos conspiracionistas? E independentemente da resposta dessas questões, como atender o pedido de sacrifício para salvar a humanidade? Aliás, seria a humanidade digna de salvação? É com questões como essas que o roteiro escrito por Shyamalan e pela dupla Steve Desmond e Michael Sherman busca fomentar reflexões ao longo da projeção, mas elas não saem muito do lugar-comum ou ganham grande profundidade.
Mesmo assim, é relativamente
interessante acompanhar o conflito entre as crenças do grupo invasor e o
ceticismo da família, com Shyamalan conseguindo construir uma atmosfera de
tensão entre os personagens na cabana, merecendo destaque o fato de o diretor manter
a câmera muitas vezes próxima dos rostos dos atores, tirando espaço do cenário
e tornando-o mais opressivo no processo. Contribui para essa inquietação também
algumas atuações do elenco, principalmente Dave Bautista, que chama a atenção
ao fazer de Leonard uma figura pacata e que mantém uma constante lamentação em
seu tom de voz, aspectos que criam um contraste eficaz com seu físico imponente
e ameaçador. E se Ben Aldridge mostra segurança ao encarnar a convicção de
Andrew, Jonathan Groff é eficiente ao fazer de Eric um contraponto mais influenciável.
Já Nikki Amuka-Bird, Abby Quinn e Rupert Grint pouco podem fazer com
personagens essencialmente unidimensionais.
Mas se ao longo da narrativa Shyamalan cria alguma tensão, esta é quebrada sempre que o diretor insere flashbacks da vida de Eric e Andrew, mostrando compromissos que eles fizeram um com o outro ou como que um deles aprendeu a lutar. Mas esses são detalhes que não acrescentam nada de importante para a história, servindo apenas para tornar irregular o ritmo do filme. Além disso, apesar de a natureza bíblica das ideias do roteiro ser clara desde o princípio, Shyamalan parece não confiar na inteligência do espectador, resolvendo trazer explicações no terceiro ato que apenas martelam o óbvio e nos fazem revirar os olhos. Como se não bastasse, a resolução do filme além de não surpreender também soa um tanto anticlimática.
Talvez um elogio que eu possa
fazer para Batem à Porta é que M. Night Shyamalan já fez filmes muito piores.
O que não quer dizer muito levando em conta que ele também já fez filmes infinitamente
melhores.
Nota:
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