segunda-feira, 26 de setembro de 2011

O Lutador

(Texto originalmente escrito para a aula de Análise da Produção Audiovisual)
O diretor Darren Aronosky é conhecido por fazer dramas em que explora o psicológico de seus personagens. Se em Pi ele mostrou um homem que ia a loucura tentando descobrir o significado de uma série numérica e em Réquiem Para Um Sonho ele mostrou a degradação que as drogas podem causar nas pessoas, em O Lutador ele nos faz presenciar a tentativa de redenção não só do personagem, Randy “The Ram” Robinson, mas também a de seu intérprete, um ator que até então tinha sua carreira considerada como acabada: Mickey Rourke.
Escrito por Robert Siegel, O Lutador nos apresenta a Randy “The Ram” Robinson, lutador de wrestling que teve o auge de sua carreira na década de 1980, mas que agora ganha dinheiro participando de lutas menores além de ser obrigado a trabalhar em um supermercado. Quando surge a proposta de uma revanche contra um velho adversário, Randy resolve aproveitar a chance, mas um infarto faz com que ele se afaste da profissão e comece a pensar um pouco mais sobre o que valorizar em sua vida.
Aronofsky começa o filme com reportagens que mostram toda a carreira vitoriosa de Randy. Ao som de “Bang Your Head”, da banda Quiet Riot, nós nos familiarizamos com o personagem logo de cara e vemos a fama que ele conseguiu. Mas logo depois dessa abertura, ouvimos a tosse de Randy, indicando imediatamente que ele não é mais o grande lutador que costumava ser em seus dias de glória. Quando finalmente vemos seu rosto, algo que demora um pouco mais do que o esperado, fica claro que este é um homem que já levou muitos socos não só dos adversários, mas também da vida. E a atenção de Aronofsky aos detalhes, como os barulhos de moedas nas calças de Randy, mostra como o protagonista leva uma vida precária.
Usando a câmera na mão e seguindo Randy de perto (algo que fez também com Nina, personagem de Natalie Portman em Cisne Negro), Aronosfsky dá um caráter documental que cai como uma luva para o filme, tornando a história mais real. Além disso, o diretor nos apresenta aos bastidores do wrestling. Vemos que todos aqueles brutamontes são como uma família e encenam os golpes que darão na hora de lutar. Não que tudo seja mentira, já que o diretor faz questão de mostrar que os lutadores se sacrificam nos ringues, como ao usar um pedaço de lâmina para fazer cortes em si mesmos. E o fato de todos eles serem amigos nos faz entender o porquê de Randy não se sentir a vontade em abandonar a profissão. Afinal, aquele é o único lugar onde ele é respeitado por suas conquistas.
O roteiro consegue tratar muito bem essa parte na qual Randy ainda não sabe o que fazer: colocar sua vida em risco nos ringues ou se entregar a sua rotina e seu verdadeiro nome (Robin)? Ele volta a ver sua filha, Stephanie, que à primeira vista não consegue nem olhar na sua cara, e arranja um trabalho melhor no supermercado (algo que rende uma das cenas mais descontraídas do filme). Esses acontecimentos dão sinal de que uma vida normal não parece ser impossível para ele e também não é de todo ruim.
O Lutador não conta só a história de Randy, mas também a da bela Cassidy, stripper e talvez melhor amiga do lutador. Assim como Randy, Cassidy não está mais no auge de sua carreira, sendo hostilizada por vários clientes que a consideram uma velha, apesar de ainda ser maravilhosa. Com isso, vemos dois personagens que encontram um no outro uma válvula de escape para revisitar os velhos tempos. Se Cassidy ouve as histórias de Randy com total atenção, o lutador a acha uma das mulheres mais lindas que já viu. E não deixa de ser curioso que os dois se escondam atrás de nomes artísticos.
Randy “The Ram” Robinson foi o personagem perfeito para o grande retorno de Mickey Rourke. Sendo um dos melhores atores de sua geração, Rourke largou tudo isso no final da década de 1980 para se tornar lutador de boxe. Quando tentou voltar, seu rosto de galã não era mais o mesmo e ninguém arriscava dar papéis importantes para ele. Sendo assim, O Lutador acaba ganhando alguns toques de biografia por se tratar uma volta por cima, e Rourke brilha desde o primeiro segundo em que aparece. O ator não só consegue retratar a decadência de Randy impecavelmente, mas também mostra todo sacrifício dele pela profissão que tanto adora. Em vários momentos do filme, Rourke sutilmente consegue nos passar o que Randy está sentindo, como a tristeza ao saber que não pode mais lutar ou quando vai a uma feira de velhos lutadores e olha o estado de seus ex-colegas de trabalho, pensando claramente que não se permitirá ficar como eles. Uma atuação espetacular que infelizmente não recebeu o Oscar tão merecido.
Mas se Rourke é a grande estrela do filme, Marisa Tomei não fica muito atrás. Trazendo grande carisma para Cassidy, a atriz consegue mostrar o cansaço da personagem em ter que ficar tirando a roupa por gorjetas medíocres. Isso fica mais claro na cena em que Cassidy se rebela e ao sair pela porta da boate diz seu nome verdadeiro (“Pam”) em forma de desabafo. Evan Rachel Wood, interpretando Stephanie, aparece sempre com uma expressão triste, de decepção com o pai que nunca esteve presente em sua vida. Por causa do medo de Randy em não querer decepcioná-la novamente, Wood protagoniza com Rourke uma das cenas mais bacanas do filme, quando pai e filha começam a dançar em um salão abandonado depois de ele desabafar e dizer tudo o que sente.
Embalado pela belíssima canção “The Wrestler”, composta especialmente para o filme por Bruce Springsteen, o final de O Lutador é triste, mas fecha com chave de ouro a história de Randy “The Ram” Robinson. Uma pena que esta seja uma das várias produções de 2008 que não receberam o devido reconhecimento na temporada de premiações. Uma obra-prima com um protagonista entregando a melhor atuação de sua carreira merecia mais atenção.
Cotação:

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