terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Riddick 3

Richard B. Riddick era o melhor personagem da eficiente ficção científica Eclipse Mortal, filme no qual dividia as atenções com outras figuras de menor destaque. Mas Vin Diesel e os produtores do filme resolveram levar adiante a ideia de uma franquia para o personagem. Tal decisão infelizmente rendeu A Batalha de Riddick, que se preocupou muito mais em ter uma escala grandiosa, com toneladas de efeitos visuais, do que em desenvolver uma história interessante (o próprio protagonista chegou a ser um tanto aborrecido nessa continuação). Com a decepção que esse filme provocou, foram necessários quase dez anos para que alguém quisesse trazer Riddick de volta às telonas, o que acontece neste Riddick 3.

Escrito e dirigido por David Twohy (retornando às mesmas funções que exerceu nos episódios anteriores), Riddick 3 coloca o anti-herói isolado em um planeta desconhecido depois de quase ser morto pelos Necromongers, povo do qual ele se tornou rei no filme anterior. Enfrentando uma série de animais selvagens, Riddick busca uma forma de sair daquele lugar. Essa possibilidade surge ao acionar um sinal de emergência em uma estação. Nisso, um grupo de caçadores de recompensa e outro de mercenários aparecem em seu encalço, sendo que o líder de um deles é ligado a um velho conhecido.
Riddick 3 lembra muito Eclipse Mortal, com o protagonista explorando o universo no qual se encontra e sendo obrigado a encarar alguns perigos para sobreviver. As semelhanças ficam ainda mais evidentes depois que Riddick encontra os grupos que querem pegá-lo, com o roteiro até adotando uma estrutura formulaica, com vários personagens morrendo até que sobre apenas aqueles realmente importantes. Mas, mesmo se eximindo de apresentar algo novo, David Twohy aproveita a oportunidade para criar sequências de tensão, o que faz com competência, principalmente na segunda metade da história, quando os personagens passam a ser atacados por várias criaturas que surgem de onde menos esperamos. Além disso, o design de produção e a fotografia de David Eggby fazem um bom trabalho com relação ao visual do planeta onde a história se passa, ressaltando toda a escassez do lugar.
No entanto, Riddick 3 ainda assim tem problemas que tiram boa parte do interesse que o público poderia ter na história. Os primeiros minutos do filme, por exemplo, contam com uma narração em off de Riddick que mostra de um jeito bem expositivo seu pensamento diante da situação que está passando, além de vermos uma sequência na qual Twohy explica displicente e superficialmente o que aconteceu entre o protagonista e os Necromongers para que ele tenha sido abandonado. Outro grave problema é a monotonia que domina a primeira metade da trama, com o protagonista quase ficando de lado a partir de determinado momento para que os caçadores de recompensas e os mercenários possam ser apresentados. O que só piora as coisas, graças ao fato de nenhum desses personagens ser muito interessante. E o roteiro também investe em coincidências batidas demais, como quando o líder dos caçadores, Santana (Jordi Mollà), está prestes a matar alguém, mas é parado no momento certo por um elemento inesperado.
Mesmo sendo problemático, Riddick 3 ao menos se revela um pouco melhor do que A Batalha de Riddick, trazendo ainda um Vin Diesel confortável interpretando um de seus principais personagens. Mas considerando que as continuações não estão conseguindo ser tão boas quanto Eclipse Mortal, devo dizer que não será de todo ruim se as aventuras de Riddick se encerrarem por aqui.
Nota:

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Tudo Por Um Furo

O Âncora foi uma comédia da qual ninguém esperava grande coisa, mas acabou surpreendendo com suas ótimas tiradas e um elenco carismático liderado por Will Ferrell no papel de Ron Burgundy. Tal sucesso refletiu nas bilheterias americanas, mas infelizmente o resto do mundo não caiu muito de amores pela produção. O resultado foi o fracasso no mercado internacional, incluindo no Brasil. Quase dez anos após o lançamento, Ferrell e companhia retornam nesta continuação que ganhou em nossas terras o título de Tudo Por Um Furo, em uma tentativa de fazer com que ela seja mais bem sucedida que o primeiro filme, não tendo qualquer referência explícita de que se trata de uma nova história com os mesmos personagens.

Escrito pelo próprio Will Ferrell e pelo diretor Adam McKay, Tudo Por Um Furo nos coloca na Nova York de 1979. Ao lado de sua agora esposa Veronica Corningstone (Christina Applegate), Ron Burgundy apresenta o telejornal de uma das maiores redes de televisão do país. Mas depois que o principal âncora do canal, Mack Tannen (Harrison Ford), decide se aposentar, este resolve promover Veronica e despedir Ron, deixando-o com inveja a ponto de abandonar a esposa e o filho, Walter (Judah Nelson). É quando recebe a proposta de recomeçar tudo em outro canal, o The Global News Network (GNN), trazendo de volta seu velho time formado por Brian Fantana (Paul Rudd), Brick Tamland (Steve Carrell) e Champ Kid (David Koechner).
Mantendo o tom escrachado que aparecia no filme anterior, Tudo Por Um Furo faz de tudo para levar o espectador ao riso. No entanto, diferente do que acontecia antes, quando as risadas surgiam com naturalidade, dessa vez é possível ver que em alguns momentos todos os envolvidos estão desesperados para alcançarem seu objetivo. Em cenas que foram claramente improvisadas no set, Adam McKay e o elenco deixam clara a intenção de incluir certas piadas no filme custe o que custar, e infelizmente nem sempre conseguem fazer com que elas funcionem. Um bom exemplo são àquelas em que Ron fica encarando seu rival, Jack Lime (James Marsden).
Mesmo assim, ao longo da projeção o filme tem belas sacadas e consegue divertir com seus personagens. É engraçado ver, por exemplo, a cena em que Ron e sua equipe precisam pensar nas notícias que colocarão em sua transmissão e vetam uma que fala sobre a China estar se tornando uma superpotência econômica, já que isso é considerado improvável. Ferrell e McKay também não temem se repetir no roteiro, inserindo um combate entre várias equipes de telejornal que é praticamente igual a uma das melhores cenas de O Âncora, ficando diferente (e até mais engraçada) pelo fato de as participações especiais de alguns atores famosos serem totalmente inesperadas, como a de uma certa atriz ganhadora do Oscar. Mas nada supera o pequeno acidente que Ron e seus amigos sofrem em um trailer, quando McKay faz uso do slow motion de maneira absolutamente hilária.
Mas o que tira mesmo alguns pontos de Tudo Por Um Furo é a dedicação do roteiro a determinadas subtramas que não são tão interessantes. Se por um lado Ferrell e McKay acertam ao trazer um romance entre Brick e Chani (Kristen Wiig), uma secretária da GNN que, apesar de clichê, é responsável por algumas boas risadas, por outro erram ao apostar na relação pai e filho entre Ron e Walter, que é desenvolvida rasamente e só ganha mais atenção depois da metade do filme, quando se torna um ponto importante da trama. O mesmo pode ser dito sobre a parte em que Ron tem um problema que o deixa debilitado, o que soa um tanto desnecessário e rende momentos muito exagerados.
De qualquer forma, Tudo Por Um Furo nunca chega a ficar entediante, e isso se deve também ao elenco, que volta a interpretar seus personagens com o mesmo carisma visto antes, além de terem uma dinâmica divertida de se acompanhar. Assim, o filme pode até ser um pouco inferior ao seu antecessor, mas ainda assim representa um bom reencontro com Ron Burgundy e sua equipe.
Nota:

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Um Conto do Destino

Baseado no livro de Mark Helprin, Um Conto do Destino se passa majoritariamente em 1916 e conta a história de Peter Lake (Colin Farrell), ladrão que ao invadir uma mansão, achando que não há ninguém por ali, conhece a bela Beverly Penn (Jessica Brown Findlay), que está morrendo por causa da tuberculose. Eventualmente os dois se apaixonam, mas Peter está com problemas com seu antigo chefe, Pearly Soames (Russell Crowe), que, além de ser algo mais assustador do que aparenta, quer acabar com sua vida e as de quaisquer outras pessoas ao seu redor.

Estreia do roteirista picareta Akiva Goldsman como diretor, Um Conto do Destino se revela um teste de paciência para o espectador. Sendo um romance com uma boa dose de fantasia, o filme já falha no modo como apresenta seu universo, já que é um tanto ridículo quando surgem os elementos mais fantásticos, como o cavalo mágico que salva Peter dos capangas de Pearly ou a verdadeira natureza de um personagem. No entanto, esse é apenas um dos problemas da narrativa, e nem é o mais grave. O roteiro (também assinado por Goldsman) adota uma estrutura que não é funcional para a história, iniciando a o filme intercalando cenas que se passam em 1895 (com os pais de Peter), 1916 e 2014 (onde vemos o protagonista investigando seu passado), sendo que essa parte do futuro não só faz a trama ficar um pouco previsível como ainda é mostrada novamente mais tarde, o que faz sua presença no início ser totalmente desnecessária.

Como se não bastasse, o diretor não consegue criar um pingo de tensão durante o filme, o que era necessário para que algumas cenas funcionassem, e ainda faz de tudo para nos levar às lágrimas, dando um tom excessivamente sentimental a narrativa e usando até uma trilha melosa (que surpreendentemente foi composta em parte por Hans Zimmer). Mas isso mais irrita do que ajuda a tornar o filme envolvente. Além disso, alguns dos diálogos que Goldsman inclui no roteiro chegam a doer nos ouvidos de tão ruins, como quando Peter e o pai de Beverly, Isaac (William Hurt), discutem a pronúncia de certas palavras, ou a primeira conversa entre o protagonista e sua amada.

Nem o elenco, cheio de grandes nomes, se salva. Colin Farrell e Jessica Brown Findlay se esforçam, mas não conseguem fazer de Peter e Beverly figuras interessantes pelas quais possamos nos importar, o que consequentemente tira o impacto de determinados momentos. Farrell, aliás, não deixa de ser um exemplo de miscast, considerando que Peter deveria ter cerca de 20 anos e o ator não convence como alguém mais jovem. E se Jennifer Connelly não tem muito o que fazer em cena, Will Smith surge no puro overacting interpretando um tal de Juíz, ao passo que a veterana Eva Marie Saint tem em mãos uma personagem que talvez nem devesse estar viva quando aparece, em uma das coisas que Akiva Goldsman força para atender as necessidades de seu roteiro. Mas quem surpreende mesmo é Russell Crowe, que aqui investe numa composição incrivelmente caricatural no papel de Pearly Soames, tendo a pior atuação de sua carreira (a cena em que o personagem aparece bêbado no início é constrangedora).

Bobo e chato ao longo de suas duas horas de duração, Um Conto do Destino prova que se Akiva Goldsman já não era um roteirista digno de admiração, como diretor ele realmente não leva jeito.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

RoboCop

Clássico da década de 1980, RoboCop: O Policial do Futuro é um filme de ação exemplar ao mesmo tempo em que trata com eficiência a parte humana e a parte máquina de seu protagonista e faz uma crítica interessante à sociedade em si. Uma pena que seu sucesso tenha rendido duas continuações que, infelizmente, foram tão fracas que enterraram a franquia. Mas agora, 20 anos após o lançamento do terceiro filme, o personagem volta às telas neste remake comandado pelo brasileiro José Padilha, em sua estreia em Hollywood.

Escrito por Joshua Zetumer, RoboCop se passa no ano de 2028 e mostra que a empresa OmniCorp tem conseguido sucesso em manter sob controle as populações de países do Oriente Médio com seus robôs. No entanto, o presidente da empresa, Raymond Sellars (Michael Keaton), não tem permissão para utilizar suas tecnologias em solo americano, considerando que as máquinas não pensam ou sentem como os humanos. Ao lado do Dr. Dennett Norton (Gary Oldman), Sellar pensa em colocar um homem dentro de uma máquina. Nesse universo, o policial Alex Murphy (dessa vez interpretado por Joel Kinnaman) representa uma ameaça ao chefão do crime local e a seus colegas corruptos, sendo gravemente ferido em um atentado. Surge então a oportunidade perfeita para que Sellars e Norton ponham em prática seu plano, salvando a vida de Alex e procurando manter a segurança nas ruas de Detroit.

Sendo uma espécie de releitura do personagem, este remake é interessante por mostrar estar disposto a se arriscar, mudando certos detalhes que são famosos quando se fala no herói, como sua armadura, que apesar de ser parecida com a original inicialmente, fica bem diferente depois, além de ser mais rápida, o que contribui para que o personagem tenha uma maior agilidade nas cenas de ação. Aliás, a ação de modo geral é conduzida com competência por José Padilha, que usando muito a câmera na mão ressalta bem a tensão das sequências, principalmente aquelas envolvendo tiroteios, como àquele no primeiro ato que traz Murphy e seu parceiro Jack Lewis (Michael K. Williams) contra alguns capangas. Mas há de se ressaltar que a câmera tremida faz determinados momentos ficarem um tanto confusos, com Padilha não conseguindo deixar clara a geografia das cenas.

Tecnicamente RoboCop não decepciona. O ótimo design de produção cria um futuro convincente e não tão distante da nossa atual realidade (não é á toa que vemos política externa e a inclusão de drones por aqui), ao passo que a montagem da dupla Daniel Rezende (parceiro habitual de Padilha) e Peter McNulty traz um bom ritmo a história e é responsável por um dos melhores momentos do filme: a cena em que Murphy aos poucos acorda de um sonho para se encontrar pela primeira vez dentro da armadura que precisará usar. E a fotografia de Lula Carvalho (outro que sempre contribui com o diretor) acerta ao incluir um tom mais pastel em um escasso Teerã e outro mais claro na Detroit cheia de tecnologias, o que cria um belo contraste.

Enquanto isso, o roteiro encontra problemas ao desenvolver a história e suas subtramas, já que é muita coisa para lidar, o que deixa o filme um pouco sem foco, como no momento em que Murphy analisa o medo que seu filho tem sentido apenas para logo depois ir investigar quem causou a explosão que quase o matou. Mas Joshua Zetumer é hábil na forma como trata temas que inclusive permeavam o filme original de Paul Verhoeven, como o poder das grandes corporações (que ultimamente têm ocupado bastante a vaga de vilões no cinema americano) e a humanidade de seu protagonista. Nesse último aspecto, por sinal, RoboCop abre mais espaço para a esposa de Murphy, Clara (Abbie Cornish), e o filho deles, criando um drama familiar até curioso de se ver na história, ainda que essa parte caia um pouco no melodrama de vez em quando.

Já o elenco que José Padilha tem em mãos é outro acerto do filme. O não muito conhecido Joel Kinnaman surpreende trazendo carisma para Alex Murphy e tornando-o uma figura bastante vulnerável pela qual conseguimos nos importar. E se Abbie Cornish surge forte como Clara Murphy, Gary Oldman tem uma bela presença no papel de Dennett Norton, enquanto que Michael Keaton é hábil ao retratar a dualidade de seu Raymond Sellars. Para completar, Samuel L. Jackson aparece até divertido interpretando Pat Novak, apresentador de um programa sensacionalista à la José Luiz Datena (aliás, a presença desse personagem deixa claro que Padilha deu alguns toques na história).

É verdade que este RoboCop de José Padilha não é tão bom quanto o filme icônico que o originou. Mas para um remake que reintroduz o personagem no cinema ainda funciona satisfatoriamente, sendo uma grata surpresa.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Ela / 12 Anos de Escravidão


Não ando com muito tempo pra escrever críticas sobre alguns filmes que estou assistindo nos cinemas, mas deixo aqui meus comentários sobre duas produções que estão concorrendo ao Oscar desse ano.

Ela

Dirigido por Spike Jonze, Ela se passa em um futuro próximo, no qual somos apresentados a Theodore (Joaquim Phoenix), um homem solitário que está se divorciando da esposa Catherine (Rooney Mara). Para tentar preencher o vazio que tem em sua vida, Theodore então adquire um sistema operacional de última geração que se dá o nome de Samantha (voz de Scarlett Johansson), sendo que ela mostra ser mais do que um mero computador, demonstrando ter consciência e até mesmo sentimentos. Samantha passa a entender Theodore mais do que ninguém, e os dois iniciam um romance inusitado.

Mas por mais inusitado que seja, é um relacionamento tratado com tanta delicadeza por Jonze que em momento algum estranhamos o que vemos na tela, sendo que os sentimentos entre os personagens surgem naturalmente, mesmo que à primeira vista eles não pareçam reais. E é interessante como ao mesmo tempo o roteiro escrito pelo próprio diretor discute tão bem o amor em si e a relação que as pessoas têm com computadores (aliás, a realidade do filme parece nem estar muito longe de nós considerando que o aplicativo Siri já existe e é usado por várias pessoas). Além disso, Jonze é hábil ao explorar a premissa o máximo que pode, chegando a criar uma espécie de universo paralelo no qual Samantha faz amizade com outros sistemas operacionais. Para completar, o design de produção faz um grande trabalho no visual futurístico do filme, ao passo que a fotografia cria um tom melancólico que combina perfeitamente com os personagens e a história.

Contando ainda com uma atuação maravilhosa e incrivelmente sensível de Joaquim Phoenix como Theodore (uma das melhores de sua carreira) e um trabalho de voz excelente de Scarlett Johansson como Samantha (em um mundo justo, a atriz seria considerada para alguns prêmios), Ela é desde já um dos melhores filmes do ano e um dos grandes destaques entre os indicados ao Oscar, ao lado de Gravidade e O Lobo de Wall Street.

12 Anos de Escravidão

12 Anos de Escravidão conta a história de Solomon Northup (interpretado por Chiwetel Ejiofor), um homem livre que é sequestrado e vendido como escravo. Sob o nome de Platt, Solomon passa por um verdadeiro inferno, principalmente quando chega à fazenda do cruel Edwin Epps (Michael Fassbender), quando passa a lutar para sobreviver até conseguir uma oportunidade para voltar para sua família.

Diferente do estilo que empregou em seus outros trabalhos (os excelentes Fome e Shame), o diretor Steve McQueen aqui conduz a narrativa de maneira um pouco mais comum, mas não menos eficiente. O diretor é inteligente ao não deixar a história cair no melodrama e ainda traz grande peso para as situações pelas quais Solomon passa ao longo do filme, investindo, por exemplo, em planos longos (algo até comum em sua filmografia) em cenas específicas, como quando os escravos são punidos, o que também impõe uma crueza incômoda para as imagens (nesse sentido, é impossível esquecer a sequência no final do segundo ato em que um personagem leva uma série de chicotadas nas costas, no momento mais angustiante da projeção). E tecnicamente o filme também merece louvores, desde o design de produção, que faz uma ótima recriação de época, até a montagem, que intercala a vida atual de Solomon com alguns flashbacks que são inseridos organicamente na história.

Já o elenco se revela um dos pontos altos do filme. O talentoso Chiwetel Ejiofor traz força e determinação para Solomon, em uma atuação que prende a atenção do público do início ao fim. E se a estreante Lupita Nyong’o se revela uma grata surpresa no papel da escrava Patsey, é inegável que quem acaba roubando a cena sempre que aparece é o excepcional Michael Fassbender, que surge absolutamente assustador como Edwin Epps.

12 Anos de Escravidão não chega a ser tão bom quanto os trabalhos anteriores de Steve McQueen, mas é mais um belo filme em sua filmografia e que o mantém como um dos diretores mais interessantes que surgiram nos últimos anos.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O Maravilhoso Agora

Em O Maravilhoso Agora, Sutter Keely é um cara popular no colégio, prestes a se formar e que, diferente de seus colegas, não se importa muito com faculdades e o futuro em si. Ele é o tipo de cara que pensa no agora, se sentindo confortável em aproveitar tudo o que está à sua disposição. Depois de terminar com a namorada, Sutter conhece Aimee Finecky, garota que é basicamente o oposto dele. É quando iniciam um relacionamento que pode ajudá-los mais do que imaginam.

Interpretados por Miles Teller e Shailene Woodley, Sutter e Aimee poderiam protagonizar em O Maravilhoso Agora a típica história do “garoto-problema” que se envolve com a “garota certinha”, estereótipos comuns em romances. O filme até tem alguns conflitos previsíveis nesse tipo de história, mas estes são tratados de maneira muito natural pelo roteiro escrito por Scott Neustadter e Michael H. Weber, felizes por não estarem em busca de resoluções fáceis para o filme. Os personagens são desenvolvidos com calma, com problemas que definem um pouco o modo de cada um agir, sendo que alguns fazem parte da vida de qualquer adolescente que está passando para a fase adulta.
No entanto, para que O Maravilhoso Agora funcionasse, era essencial que a dupla de protagonistas fosse eficiente. Felizmente, o filme acerta em cheio ao apostar em Miles Teller e Shailene Woodley como centro de sua narrativa, duas ótimas revelações dos últimos anos. Teller (que conseguiu ser uma das poucas coisas boas no fraco Finalmente 18) surge com um carisma arrebatador como Sutter, fazendo dele um personagem divertido e boa praça, ao mesmo tempo em que é um rapaz amargurado não só por sentir a ausência do pai, mas também por ver seus amigos levando suas vidas e sonhos adiante, enquanto ele vai ficando para trás. Nesse sentido, a cena em que conversa com a mãe (Jennifer Jason Leigh) no terceiro ato é bastante tocante, representando um dos pontos altos do filme. Já Woodley (que apareceu muito bem em Os Descendentes) traz uma bela graciosidade para Aimee, tornando-a uma garota simples, sonhadora e absolutamente encantadora, protagonizando cenas muito interessantes, como quando ela fala sobre seu pai em um jantar.
Enquanto isso, o diretor James Ponsoldt conduz sua história com incrível sensibilidade, trazendo um tom mais adulto que combina com a narrativa. Ele consegue impedir que o filme se torne uma espécie de melodrama, o que poderia acontecer quando vemos um determinado acidente. Ponsoldt também tem sorte da química entre Miles Teller e Shailene Woodley ser brilhante, detalhe que contribui muito para que o público se importe com os protagonistas e, consequentemente, se sinta envolvido na história. E além de caprichar nas cenas mais dramáticas, é bom ver que o cineasta mostra um ótimo timing cômico em alguns momentos, como quando o rapaz dá uma dica para a namorada sobre como ela pode falar com a mãe a respeito dos sonhos que tem para sua vida. Inteligente e doce durante seus 95 minutos de duração, O Maravilhoso Agora é um romance adolescente que conta com um bem-vindo frescor em sua história, sendo uma das gratas surpresas de 2013.
Nota:

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Caçadores de Obras-Primas

Desde que estreou como diretor, no excelente Confissões de Uma Mente Perigosa, George Clooney mostrou uma segurança invejável na condução de seus filmes, tendo errado apenas no medíocre O Amor Não Tem Regras. Depois de lançar seu melhor trabalho, Tudo Pelo Poder, Clooney retorna para trás das câmeras neste Caçadores de Obras-Primas, mas é uma pena que este represente o segundo erro em sua carreira de diretor.
 
Com roteiro escrito por Clooney e por seu parceiro habitual Grant Heslov, baseado no livro de Robert M. Edsel e Bret Witter, Caçadores de Obras-Primas conta a história real de um pelotão na Segunda Guerra Mundial que ficou responsável por salvar o maior número possível de obras de arte, antes que estas sejam destruídas durante as batalhas. Liderados por Frank Stokes (Clooney), o grupo está disposto a fazer de tudo para manter intactos tantos anos de cultura.

A ideia por trás do filme é interessantíssima, sem dúvida alguma, mas sua execução deixa muito a desejar. Clooney se mostra indeciso quanto ao tom que quer dar a história, que uma hora parece uma comédia e em outra tenta ser um drama propriamente dito. Consequentemente, o filme tem problemas graves de ritmo, não sendo tão envolvente quanto deveria. O diretor também revela até um pouco de autoindulgência em alguns momentos, incluindo cenas que além de longas demais ainda são absolutamente desnecessárias, já que não adicionam nada ao filme e apenas travam o desenvolvimento da trama, como quando Preston Savitz (Bob Balaban) e Richard Campbell (Bill Murray) são abordados por um soldado inimigo ou a cena em que um personagem pisa em uma mina terrestre.

Enquanto isso, em determinado momento o roteiro estrutura a história em cima das missões que cada membro do pelotão recebe. Mas nem todos eles recebem muita atenção, em especial James Granger (Matt Damon), que ao lado de Claire Simone (Cate Blanchett, apagada) fica em uma subtrama que aparece um tanto perdida no meio do filme (e o roteiro quase sugere um romance entre os dois personagens, em mais um detalhe que não acrescenta nada a história). E os vários diálogos nos quais Stokes discute se vale a pena arriscar a vida por uma obra de arte cansam depois de um tempo, ainda mais por trazerem uma trilha sentimental e batida do geralmente eficiente Alexandre Desplat, que busca ressaltar de um jeito óbvio demais o quão importante são as palavras do personagem.

Já o elenco faz o que pode com personagens unidimensionais. Os atores talentosos reunidos por Clooney têm um bom nível de carisma, desde o próprio diretor até Matt Damon, passando por Bill Murray, John Goodman, Jean Dujardin, Hugh Bonneville e Bob Balaban, tendo uma bela dinâmica em cena. Mas infelizmente, isso não é o suficiente para que nós nos importemos com o que acontece com eles ao longo do filme, o que tira o impacto de certas cenas.

Caçadores de Obras-Primas poderia ter sido um belo filme. Mas o que vemos aqui é uma obra bem decepcionante e esquecível, ao contrário daquelas que foram resgatadas pelos personagens, cuja história poucos têm conhecimento.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Um Dia na Vida


Conseguir assistir a Um Dia na Vida é quase um sonho para boa parte dos cinéfilos, em especial os fãs de Eduardo Coutinho. Um desejo que poucos conseguem realizar, já que o filme talvez nunca seja lançado comercialmente. Consistindo em uma série de imagens de alguns canais da TV aberta brasileira, Um Dia na Vida teria grandes dificuldades para obter os direitos de imagem. Mas as pessoas que têm uma chance de conferir o longa acabam tendo o prazer de ver mais uma grande obra de um dos melhores diretores da história do cinema, na qual ele expõe muito do que há de pior na televisão brasileira.

Coutinho gravou 19 horas de material da TV aberta como parte de uma pesquisa para um projeto futuro (nem preciso dizer que o diretor deve ter mudado de ideia com relação ao que fazer com as imagens). De posse desse material, fez um pequeno recorte com a programação dos canais desde a manhã do dia 1º de outubro de 2009 até a madrugada do dia seguinte. Isso pulando de emissora em emissora com naturalidade, sem nenhum tipo de narração em off que pudesse conduzir o pensamento do público, nos deixando tirar as próprias conclusões sobre o que vemos na tela.

Sendo assim, é impressionante como é gritante a falta de noção dos responsáveis pelos canais quanto ao conteúdo que vai ao ar. Logo no início da manhã, por exemplo, acompanhamos um quadro em um programa da Bandeirantes falando sobre tipos sanguíneos, com a convidada dizendo que as pessoas devem comer alimentos que sejam apropriados para seu sangue, porque isso influencia em suas vidas (oh, céus!). Pouco depois disso, Wagner Montes aparece no Balanço Geral dizendo que um homem bater em uma mulher é covardia porque ele só precisa segurá-la (deixá-la em paz, pelo visto, está fora de questão), emendando isso com a notícia de um assalto no qual fala que alguém deveria ter tentado atirar no ladrão, como o próprio Montes afirma que faria (espero que ninguém tenha colocado a vida em risco seguindo esse modo de agir).
Mas não sei por que me surpreendi com momentos como esses, considerando que faz algum tempo que a TV aberta vem demonstrando que seu principal objetivo, aparentemente, é ajudar na alienação das pessoas, ao invés de trazer programas um pouco mais úteis e interessantes. O que dizer da parte em que visitamos a casa de Dr. Ray, quando ele apresenta seus instrumentos de trabalho e mede uma modelo usando um crânio? E quando pensamos que Coutinho já mostrou o pior, ele ainda consegue surpreender. Na faixa das 19h, o diretor inclui um momento do TV Fama no qual Nelson Rubens diz que chegou a hora de descobrirmos com quem Silvio Santos divide a cama, o que é absolutamente constrangedor. Além disso, o espaço dado a programas religiosos que buscam influenciar seus espectadores com preconceitos é lamentável, assim como programas como aquele apresentado por Marcia Goldsmith, que se aproveitam das situações das pessoas para ganhar audiência.
Um Dia na Vida mostra que a TV aberta brasileira chega a ser uma piada de mal gosto, e é incrível que uma boa parcela da população realmente assista as coisas que Coutinho insere ao longo do filme. Enquanto vemos isso, é triste constatar que de 2009 para cá a programação dos canais não mudou quase nada. E, infelizmente, duvido que vá mudar tão cedo.
Nota:


terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Guerras Sujas

Quando vemos as notícias na TV, quase sempre há algo sobre uma bomba que explodiu em determinado lugar ou conflitos que tiraram as vidas de várias pessoas a cada dia que passa. E os Estados Unidos estão envolvidos em praticamente todos esses eventos, direta ou indiretamente. No entanto, não ficamos cientes de toda a carnificina envolvida nisso. Há coisas que ganham pouca atenção por parte das pessoas ou são até ignoradas, e é exatamente esses pontos que o repórter investigativo Jeremy Scahill tenta trazer à tona em Guerras Sujas, indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2014.

Dirigido por Rick Rowley, Guerras Sujas acompanha Jeremy Scahill em suas passagens por países como Afeganistão e Somália, onde ele mostra as situações desses lugares diante do poderio militar americano presente por ali, mais especificamente o grupo secreto JSOC (Joint Special Operation Comand, ou Comando de Operações Especiais Conjuntas), cujos membros são vistos como heróis por boa parte dos americanos por serem os responsáveis pela morte de Osama Bin Laben. Mas Scahill lidera uma verdadeira investigação para mostrar que o JSOC comete várias atrocidades contra a população daqueles países, agindo quase como juízes, júris e executores, chegando a ponto de matar pessoas inocentes sem muito propósito, inclusive cidadãos americanos. Tudo isso com o governo de Barack Obama dando apoio e liberdade para que façam aquilo que quiserem, uma prova de que o jeito de bom moço do presidente é uma espécie de máscara.
Como toda boa investigação, Guerras Sujas desencava informações que sempre acabam levando a outros detalhes que ajudam Scahill a se aprofundar ainda mais naquilo que busca retratar. A cada descoberta feita pelo repórter, mais revoltante fica a situação daqueles países. Como quando vemos um vídeo no qual um grupo de soldados americanos aparece diante dos corpos baleados dos membros de uma família, discutindo uma versão dos fatos na qual eles não seriam os responsáveis pelas mortes. Algo decepcionante é o fato de Scahill tentar revelar isso em rede nacional e ser totalmente desacreditado, o que podemos ver no momento em que ele aparece em alguns talk shows diante de figuras que não se importam com o que ele tem a dizer. E por continuar seu trabalho, mesmo que no fim não consiga chamar a atenção de ninguém, Scahill revela o quão grande é sua determinação.
Por estarmos falando de uma investigação, Rick Rowley acerta em cheio ao trazer um formato de thriller que combina perfeitamente com a narrativa, o que é ressaltado, por exemplo, pela fotografia mais granulada nos momentos em que algumas pessoas aparecem respondendo perguntas para Scahill (pessoas estas que quase sempre estão claramente escondendo informações). Enquanto isso, a narração em off do repórter é importante por criar um certo diálogo com o espectador e conduzi-lo diante de tudo aquilo calmamente.
É bom ver que Guerras Sujas está ganhando algum reconhecimento em premiações. Trata-se de um documentário extremamente relevante, que aponta para uma série de assuntos e fatos que todas as pessoas deveriam saber. Mas o que o filme mostra pode ser apenas uma parte de algo muito maior. E se o que vemos aqui é chocante o bastante, imaginar o resto acaba sendo uma tarefa aterrorizante.
Nota:

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Caçada ao Outubro Vermelho

Criado por Tom Clancy, o analista da CIA Jack Ryan protagonizou uma série de livros do escritor entre as décadas de 1980 e 2000. O personagem acabou ganhando sua própria franquia no cinema anos depois. E até que se trata de uma série bem consistente, na qual nenhum dos filmes chega a ser realmente ruim. Caçada ao Outubro Vermelho foi a primeira adaptação a ser lançada, e trouxe Alec Baldwin interpretando o personagem em um elenco que tinha como grande destaque a participação do grande Sean Connery.

Escrito por Larry Ferguson e Donald Stewart, Caçada ao Outubro Vermelho tem sua história situada em 1984, em plena Guerra Fria. O capitão soviético Markus Ramius (Connery) comanda o Outubro Vermelho, um submarino com um sistema de propulsão que o torna imperceptível para sonares. Ramius coloca o submarino em direção aos Estados Unidos, desobedecendo as ordens que recebeu de seus superiores e fazendo todos pensar num provável ataque. No entanto, Jack Ryan tem quase certeza de que o capitão planeja desertar, e precisa provar isso a seus superiores e à tripulação do submarino americano USS Dallas, antes que tentem afundar o possível inimigo.
Contando com vários núcleos narrativos (temos Jack Ryan na CIA, o pessoal na Casa Branca e as tripulações do Outubro Vermelho, do USS Dallas e do V.K. Konovalov, outro submarino soviético), o roteiro é hábil ao estruturar a história em cima deles sem confundir o espectador nem tirando o foco de seus dois melhores personagens, Ryan e Ramius. Nesse sentido, a ótima montagem de Dennis Virkler e John Wright merece crédito por pular de um núcleo a outro sem quebrar o ritmo do filme, além de investir em transições elegantes em alguns momentos, como o raccord sonoro entre um copo quebrando e um telefone tocando. Mas é mesmo por ter duas figuras inteligentes no centro de sua narrativa que Caçada ao Outubro Vermelho acaba sendo muito interessante, já que nos faz acompanhar todas as estratégias de ambos os personagens para fazerem seus planos darem certo. E não é à toa que, se o filme é bom na maior parte do tempo, fica melhor ainda quando os dois aparecem juntos em cena, o que ocorre apenas no terceiro ato.
Alec Baldwin se revela uma escolha acertada para o papel de Jack Ryan, já que o personagem é “apenas um analista” (como ele mesmo diz em determinado momento) que se vê em meio ao trabalho de campo quase sem querer, não sendo um típico herói de ação. Consciente disso, o ator traz um jeito de peixe fora d’água que combina perfeitamente com Ryan, e o roteiro ainda inclui nele um medo de voar que o torna um ser mais vulnerável e humano. Além disso, nosso envolvimento com Ryan é tão grande que ficamos irritados e frustrados sempre que alguém ignora o que ele tem a dizer. Já Sean Connery tem uma presença brilhante como Markus Ramius, transformando-o em uma grande autoridade só de aparecer em cena, deixando claro não só o porquê de seus comandados confiarem nele, mas também que o capitão não é um vilão na história.
O diretor John McTiernan (que na época estava em grande fase, tendo acabado de sair dos sucessos de O Predador e Duro de Matar) não chega a investir tanto em grandes sequências de ação, preferindo construir um belo nível de tensão entre seus personagens. No entanto, quando parte para uma dimensão de escala um pouco maior, McTiernan não decepciona, mantendo o espectador grudado na tela. Bons exemplos são as cenas em que Ryan precisa entrar no USS Dallas sob uma chuva intensa ou no tiroteio que ocorre próximo ao final da trama. Caçada ao Outubro Vermelho é um thriller eficientíssimo, que iniciou muito bem as aventuras de Jack Ryan nos cinemas, sendo que até hoje ostenta a posição de melhor filme da franquia.
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